São Paulo, sexta-feira, 09 de julho de 2010

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RODOLFO LANDIM

Criar mercado para o gás natural


O gás natural terá grandes desafios para conseguir um espaço compatível com o tamanho da sua oferta


MUITO SE fala hoje no Brasil das enormes perspectivas de crescimento da produção de óleo com as descobertas do pré-sal, mas pouco se diz que, com esse óleo, serão necessariamente produzidos enormes volumes de gás natural e que terá que ser feito um grande esforço para desenvolver mercado para esse produto. Por estar no estado líquido, o óleo, uma vez produzido, é facilmente armazenado e transportado até as refinarias espalhadas por todo o mundo, nas quais é transformado em diferentes derivados. Por isso o óleo é considerado uma commodity. Todo o excedente de produção de um país pode ser facilmente exportado para outro mercado.
Já o gás natural possui uma lógica muito mais assemelhada à de uma indústria de rede como a da energia elétrica. Da mesma forma que são necessários cabos para trazer a corrente elétrica desde as usinas geradoras até os clientes finais, o mesmo acontece com as redes de gasodutos, para levar as moléculas de gás desde os poços produtores até chegar às indústrias, às residências e aos consumidores em geral.
Também analogamente ao setor elétrico, em que existem empresas distintas responsáveis pelas linhas de transmissão e pelas redes de distribuição de energia, no gás natural há as transportadoras de gás e as companhias de distribuição -nesse caso, monopólios dos Estados, constitucionalmente estabelecidas e que são operadas por empresas públicas ou já privatizadas, sob a supervisão de uma agência reguladora estadual.
Portanto, o desenvolvimento de mercados para o gás natural é uma atividade extremamente complexa. Seu planejamento tem que ser integrado, passando pela busca de condições comerciais que mitiguem riscos e satisfaçam o produtor, o transportador, o distribuidor e o cliente final; e passando pela garantia de fornecimento do próprio gás em longo prazo e pela viabilização de uma infraestrutura de transporte e de distribuição, que estão na mão de agentes distintos e que nem sempre têm os mesmos foco, prioridade e velocidade de atuação. E tudo isso ocorre em um ambiente de concorrência com os demais combustíveis e energias alternativas, que também buscam o seu espaço.
Quando analisamos o cenário nacional para enfrentar esse desafio, vemos alguns pontos positivos, e outros, nem tanto. Os grandes investimentos realizados não só para a interligação das malhas de gasodutos do Sul/Sudeste e do Nordeste como para ampliar a capacidade de transporte anteriormente existente são pontos muito positivos.
Há também estudos de projetos baseados em tecnologias que permitem a liquefação do gás natural e o transporte em navios especiais para levá-lo a grandes distâncias, o que seria uma alternativa para atendimento aos mercados de parte do Norte e do Nordeste, que ainda não têm seu mercado desenvolvido por falta de matéria-prima. No entanto, esse tipo de projeto normalmente só se justifica com grandes volumes envolvidos. E o gigantesco mercado norte-americano, que seria um caminho natural para complementar a demanda desse tipo de projeto, parece ter encontrado alternativas de suprimento interno de gás com novas tecnologias aplicadas a suas enormes jazidas de gás de baixa permeabilidade.
Pelo lado do consumo, a notícia ruim é que a maior parte do mercado industrial já foi convertida para gás e resta pouco espaço para o deslocamento adicional do óleo combustível. As termelétricas, outro importante potencial mercado consumidor de gás, não serão solução para o problema, já que a operação delas e, consequentemente, o consumo de gás dependeriam do nível dos reservatórios das hidrelétricas. Mas existem outros mercados potenciais ainda a serem explorados, como o de redução direta de minério de ferro e outros de menor valor para o gás, mas de grande demanda, como o de fertilizantes.
A luta pelo mercado vai continuar a existir, e o gás natural terá grandes desafios para conseguir um espaço compatível com o tamanho da sua oferta. O jeito é aproveitar a sua característica física e sair ocupando todos os espaços disponíveis.

RODOLFO LANDIM, 53, engenheiro civil e de petróleo, é conselheiro da Smith International e da Wellstream. Trabalhou na Petrobras, onde, entre outras funções, foi diretor-gerente de Exploração e Produção e presidente da Petrobras Distribuidora. Escreve quinzenalmente, às sextas, nesta coluna.


AMANHÃ EM MERCADO:
Kevin Brown




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