São Paulo, quinta-feira, 10 de junho de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Lula no palanque final


Presidente promete que fará "qualquer coisa" contra inflação, mas o governo, na prática, não tem mais tempo


LULA DISSE ontem que vai fazer "qualquer coisa para não deixar a inflação voltar". Mas Lula não pode fazer mais nada a fim de evitar que "a inflação volte". Na verdade, nem há o risco de que "a inflação volte".
Num certo sentido, porque não há inflação -não há um processo desenfreado, geral e intenso de alta de preços. Noutro sentido da palavra, mais banal, a inflação "já voltou" -trata-se, nesse caso, da variação transitória, pois ainda controlável sem traumas, do índice de preços.
No primeiro caso, no primeiro sentido de "inflação", Lula apenas faz jogo de palavras publicitário com um perigo mais ou menos enterrado, ao menos no médio prazo -o de alta contínua de preços. Nesse sentido, a inflação poderia começar a explodir caso Lula tomasse, por exemplo, a medida tresloucada de trocar a direção do Banco Central por um bando de contínuos que baixasse os juros a zero. Mas nessa hipótese alucinada então ocorreria algo mais grave do que mera inflação.
No segundo caso, de inflação como alta transitória de preços, o governo Lula contribuiu para incrementá-la, pois baixou ou aprovou medidas de aumento de gasto público que inflaram o consumo. No que diz respeito estritamente a preços, não se trata de nada assim tão grave. O efeito pior dessa rodada final de gasto excessivo é o aumento da dívida pública. Mas, mesmo assim, o governo Lula colocou algumas toras de lenha na fogueira dos preços.
Ainda que Lula trancasse de fato os cofres públicos, o que de resto seria irracional, tal medida não teria efeito na inflação do seu tempo restante de governo. Para ainda argumentar com o absurdo, a opção restante para "não deixar a inflação voltar" (o IPCA subir) neste final luliano seria exigir do BC uma alta brutal e imediata de juros, uma tolice. O que Lula pode fazer é não deixar a casa muito desarrumada para o próximo presidente.
Lula falou de inflação num palanque em Natal. Nos seus mais de sete anos de governo, o presidente não saiu do palanque, é verdade. Com alguma boa vontade, pode-se dizer que o palanque foi parte importante do modo luliano de governar, de formar e coordenar expectativas, como gostam de dizer os economistas.
Lula formou expectativas políticas ou mudou alguns consensos sobre o que é possível e desejável em políticas públicas de transferência de renda, por exemplo. Mas ressalte-se que o talento de animador de auditório do presidente mais o "ativismo" de seu segundo mandato tiveram também algum efeito econômico -ajudaram a evitar uma recessão sinistra no Brasil de 2009.
Porém, faltando menos de sete meses para o final de seu mandato, Lula pode animar apenas a campanha de Dilma Rousseff. Para a maioria dos efeitos práticos relevantes, afora alguma improvável medida de caráter catastrófico, o governo Lula terminou. Seu ato final de importância serão as conversas para a aprovação das novas leis do petróleo.
No mais, as promessas de Lula são agora mero marketing. Promessas de campanha têm lá sua relevância. Podem influenciar o andamento da vida do país antes mesmo do próximo governo e, talvez, até criar um ambiente mais ou menos tranquilo no início da próxima administração. Mas promessas e projetos importantes são os de José Serra (PSDB), Dilma (PT) e Marina Silva (PV). Desses, mal sabemos.

vinit@uol.com.br


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