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ANÁLISE SAFRAS
Trigo deixa de ser coadjuvante e passa a ter papel principal
FERNANDO MURARO JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA
Um dos fatores fundamentais que justificam o aumento
expressivo dos preços internacionais da soja e do milho
nos últimos 60 dias foi a definição da La Niña no oceano
Pacífico no início de julho.
E a La Niña instalada rapidamente após um El Niño,
como é o caso em 2010, traz
consigo, por vezes, aumento
das temperaturas e escassez
hídrica para uma parte do
cinturão de produção dos Estados Unidos justamente em
agosto, no momento mais
importante para a definição
da produtividade agrícola
daquele país.
Resultado: na primeira semana deste mês, os preços da
soja registraram o maior valor do ano na Bolsa de Chicago. Isso significa que o mercado está adicionando um
prêmio de risco aos preços,
diante de eventual quebra da
safra norte-americana.
Os olhos do mercado mundial continuam, naturalmente, voltados para a região
agrícola que mais produz soja e milho no mundo.
Mas, ao mesmo tempo,
eles foram obrigados a prestar atenção na Rússia e na revisão dos quadros de oferta e
demanda de trigo.
A fumaça das queimadas e
o calor de 38C -algo nunca
visto antes em Moscou- ganharam as manchetes dos
jornais, enquanto os prospectos de produção de grãos
foram se tornando cada vez
mais pessimistas.
Lentamente, o foco foi desviado da até aqui boa safra
norte-americana para a quebra da safra de trigo da região
do mar Negro.
A confirmação de que o estrago era maior do que o previsto foi, na semana passada,
a suspensão, pelo governo
russo, das exportações de
grãos até dezembro. Foi o
que bastou para os preços internacionais do cereal dispararem. Os mercados da soja e
do milho vieram a reboque
do primo pobre, o trigo.
A região do mar Negro produtora de trigo envolve Rússia, Ucrânia e Cazaquistão.
Nos últimos dois anos, essa
região colheu safras recordes, próximas de 114 milhões
de toneladas, em uma safra
mundial estimada em 680
milhões. Neste ano, já se fala
entre 80 milhões e 90 milhões de toneladas, apenas.
No ciclo 2009/10, esses
países foram responsáveis
pela exportação de 35 milhões de toneladas de trigo,
ou 27% de todo o volume comercializado mundialmente.
Não é pouca coisa -daí o impacto da quebra deste ano
sobre as cotações.
Na ópera do mercado de
commodities, o trigo vai deixando de ter o papel monótono e coadjuvante de 2009 para ser o ator principal e com
voz de barítono em 2011.
Isso porque, no final de
2009, os preços pouco atrativos do trigo desestimularam
os fazendeiros dos Estados
Unidos a cultivá-lo no inverno, fazendo com que a área
plantada recuasse para a menor já registrada desde a década de 1970.
Isso abriu espaço para que
soja e milho avançassem novamente e atingissem, juntos, um novo recorde em terras norte-americanas.
Para 2011, o cenário pode
se inverter, especialmente se
os preços do trigo continuarem brilhando em carreira
solo na Bolsa de Chicago.
FERNANDO MURARO JR. é engenheiro
agrônomo e analista de mercado da
AgRural Commodities Agrícolas.
Internet: www.AgRural.com.br
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