São Paulo, segunda-feira, 10 de outubro de 2011

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ANÁLISE

Papel da escola nas finanças é menor do que o dos pais

CÁSSIA D'AQUINO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Recentemente a ideia de educação financeira transformou-se numa espécie de "conceito-ônibus": todos parecem estar de acordo quanto a sua importância. O que pouco se discute são as faces desencontradas que o conceito assumiu.
Assim, muito embora pareça haver um entusiasmado consenso sobre as escolas assumirem o processo de educar crianças e jovens em relação ao dinheiro, é preciso cautela para que, no ímpeto, bugalhos não sejam tomados por alhos.
Preocupa o exagero das atribuições que se espera ver cumpridas pelas escolas no Brasil. Está claro que o ambiente escolar deve servir como palco para reflexão e transformação dos alunos.
No entanto, em todo o mundo, a educação financeira é um assunto que cabe prioritariamente às famílias. Transferir essa responsabilidade para as escolas é ingenuidade ou oportunismo.
Nessa trama, o papel das escolas, embora importante, será sempre menor. A rigor, lhes cabe lapidar a percepção crítica dos alunos em relação ao consumo exacerbado e, por extensão, à louvação vulgar e estúpida da acumulação de dinheiro.
De outro lado, reconheça-se, o mundo mudou e a escola precisa atualizar-se. Não pode livrar-se de discutir a interdependência que sobressalta países, nem fechar os olhos à necessidade de readequação dos conteúdos pedagógicos.
Mas, acima disso tudo, a escola não tem o direito de continuar a ausentar-se de sua responsabilidade essencial: ensinar a leitura fluente e a escrita correta.
Sendo tantas as falhas do país nesse campo -dados da Unesco indicam que 75% da população é vitima de analfabetismo funcional- a principal ação de educação nas escolas deve ser, justamente, ensinar a ler e escrever apropriadamente.
É evidente que, se as crianças não tiverem acesso a esse mínimo, não encontrarão condições de inserção profissional que garantam renda para poupar, investir ou endividar-se com discernimento. Que não se perca de vista: educação financeira é importante. Mas não faz milagres.
Por fim, existe uma distorção na crença de que é possível ensinar crianças a manejar as finanças. Sejamos claros: dinheiro é um assunto de gente grande. Crianças não são pequenos adultos.
A educação financeira voltada a elas não pode prescindir da noção de longo prazo. É por isso que ensinar uma criança a fazer um orçamento doméstico faz tanto sentido quanto ensiná-la, com diagramas na lousa, a manobrar um carro.

CÁSSIA D'AQUINO é especialista em educação financeira e "Corresponding Member" da International Association for Citizenship, Social and Economics Education (IACSEE)


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