São Paulo, segunda-feira, 12 de julho de 2010

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ENTREVISTA DA 2ª

JOSÉ FRANCISCO DE LIMA GONÇALVES

Crédito cresce apesar de taxa de juros alta

Para economista, situação inédita no crédito dificulta diagnóstico de inadimplência

Folha - A economia apresenta forte expansão por conta do aumento do financiamento ao consumo. Quais os limites da oferta de crédito e da capacidade de endividamento das famílias?
José Francisco de Lima Gonçalves
- Estamos passando por algo inédito em relação a crescimento e estoque de créditos, tanto para pessoa física quanto jurídica como proporção do PIB.
Nunca havíamos chegado a um nível como o atual. Isso tem um lado bastante positivo e um lado que nos aproxima do escuro de uma situação nova.
Qual o lado bom? Anos seguidos de redução da taxa de inflação, pagamos a dívida externa, viramos G20. Isso tira um peso da política fiscal monumental e tira um peso da política monetária, igualmente monumental. Junto com isso, veio uma queda inédita na taxa de juros.
Houve ainda uma série de inovações institucionais, que ajudaram bastante na expansão do crédito. Com destaque ao crédito consignado e à legislação no que se refere ao mercado imobiliário, que acertou a questão de se usar patrimônio imobiliário como garantia.
Houve ainda melhoras no nível de renda da população em geral, principalmente entre os assalariados.
Nos últimos quatro anos, o emprego formal aumentou sua fatia no mercado de trabalho. Isso dá uma garantia adicional tanto para quem recebe o salário quanto para quem concede o crédito.

Apesar do aumento do crédito, ele ainda é muito caro (o juro médio é de 42% ao ano para pessoas físicas). Compramos uma geladeira financiada e pagamos uma e meia. Quando se resolve isso?
Está demorando. O notável é que o crédito tenha crescido tanto, apesar desse custo monumental. Mas o país é isso. Porque nos anos 80 nós quebramos, arrebentamos nossas finanças públicas. Isso exigiu a indexação da moeda e, anos depois, tivemos hiperinflação e os desdobramentos conhecidos. Só saímos disso outro dia.

Qual o risco do crescimento acelerado de um crédito ainda muito caro? Uma alta forte nos calotes de dívidas?
É muito difícil dizer se o nível atual de inadimplência é muito alto ou baixo. Eu não tenho o menor problema em dizer: tenho muita insegurança em afirmar que este nível é razoável ou que é um nível compatível com o bom andar da carruagem. Porque a gente nunca teve esse nível de crédito. É uma situação desconhecida. Isso é um grande desafio.
Mas essa preocupação com o risco é legítima. É função de quem concede crédito medir o risco e calibrar. De outro lado, há a própria desaceleração da economia.
Depende muito do momento em que você está, se haverá um efeito de saciedade, por exemplo. Quem comprou o primeiro automóvel, o segundo automóvel, o terceiro automóvel, não vai comprar o quarto automóvel. Há limites dados pela própria capacidade da economia.

O Brasil está importando quase 50% a mais do que em 2009, deteriorando as contas externas. Isso torna evidente que a economia, puxada pelo crédito, não dá conta de atender à demanda, não?
O grande risco visível é termos de caminhar para uma situação de grande deficit em conta corrente (de resultado negativos nas transações com o resto do mundo).
Isso tendo à frente a probabilidade de um evento ruim lá fora. Nada como a crise de 2008/2009, mas que faça aumentar a aversão a riscos.


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