São Paulo, domingo, 15 de maio de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

JAMES LAMONT

Freios para os sonhos da Índia


Pergunta-se se é desejável a aceleração que levaria o crescimento indiano a ultrapassar o da China


QUANDO Jawaharlal Nehru, o primeiro chefe de governo da Índia, preparou o primeiro plano quinquenal de seu país que acabara de se tornar independente, em 1951, planejou ritmo anual de crescimento econômico de 2,1%. Era uma projeção absurdamente ambiciosa. Na era do domínio britânico, a economia indiana havia avançado aos solavancos, com crescimento anual de 0,1% nas décadas que antecederam a Segunda Guerra Mundial.
Nos últimos anos, metas ambiciosas voltaram a ser moda no país, e há retórica ambiciosa quanto às aspirações indianas de concorrer com a China, propelidas por crescimento anual em dois dígitos.
No entanto, diante de fortes escândalos de corrupção e de uma inflação em disparada, as ambições indianas parecem uma vez mais estar sendo contidas -e há quem sugira que isso não é má ideia. Nos anos posteriores à independência, a opinião dominante quanto às perspectivas da Índia era muito mais pessimista que a de Nehru.
O economista Milton Friedman descreveu, em 1963, um perigo real de que "a Índia demore séculos a realizar o que outros países fizeram em décadas". O indiano, fatigado pelo calor, era, na sua opinião, "preguiçoso e pouco empreendedor", ainda que tenha acrescentado que era o Estado que sufocava as energias empreendedoras dos cidadãos.
Passadas muitas décadas, os planejadores econômicos indianos mantêm suas metas ambiciosas, e o país, na verdade, as está atingindo mais rápido do que Friedman imaginou. A Comissão de Planejamento, presidida pelo primeiro-ministro Manmohan Singh, quer adotar meta de crescimento entre 9% e 9,5% por ano, enquanto dá os retoques finais no 12º Plano Quinquenal indiano, para o período 2012-2017.
Segundo dados do FMI, a Índia já está crescendo acima dos 10% ao ano da China. Alguns economistas dizem que a ultrapassagem ocorrerá durante o 12º Plano. Em Nova Déli, porém, os planejadores estão adiando, sabiamente, a celebração do dia em que os dois países estarão se enfrentando diretamente.
Nos últimos anos, muita gente vem alardeando que a Índia é capaz de manter crescimento transformador, da ordem dos dois dígitos por ano. Singh e seu Partido do Congresso identificam o alto crescimento, hoje da ordem de 8,6% anuais, como popular entre os eleitores.
O Ministério das Finanças tem um plano sobre como chegar a isso: 4% de crescimento agrícola, 12% no industrial e 10,5% no de serviços.
Amartya Sen, Nobel de Economia e amigo de Sing, foi um dos primeiros a defender uma reconsideração, criticando o que via como foco exagerado nos números do crescimento e apontando que a ideia de uma corrida contra a China era insensata. Ele instou o governo a prestar mais atenção a indicadores como os números da nutrição e de saúde.
Outros fatores também se fizeram sentir, especialmente a corrupção. Muita gente, incluindo Sonia Gandhi, presidente do Partido do Congresso, menciona o crescimento rápido como causa para uma sucessão de escândalos de corrupção. As chances de suborno cresceram após a Índia liberalizar a economia, em 1991. Empresários, burocratas e políticos estão tirando vantagem do que Kiskor Chaukar, diretor da Tata and Sons, identifica como uma era de "concorrência entre diferentes agências fiscalizadoras".
Um segundo fator é a inflação. Ao ritmo anualizado de 9% em março, a Índia tem a mais alta inflação entre as grandes economias asiáticas. Longe de cair, como haviam previsto as autoridades, a inflação se provou difícil de derrotar. A Índia elevou a taxa de juro oito vezes em 2010. É preciso fazer mais para conter o crescimento e aliviar os preços, dizem os economistas.
Diante desse cenário, as expectativas gerais estão recuando e não avançando. Cada vez mais gente vem perguntando se uma aceleração que levaria o crescimento indiano a ultrapassar o da China é desejável em um país de 1,2 bilhão de habitantes, especialmente se envolver um aumento na disparidade de renda e na desonestidade.
Nehru e Friedman, que discordavam quanto ao planejamento central, estavam de acordo quanto a pelo menos uma coisa. Os dois viam o desenvolvimento da Índia como tarefa de longo prazo.

JAMES LAMONT é jornalista do "Financial Times".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

AMANHÃ EM MERCADO:
Maria Inês Dolci



Texto Anterior: Análise: Compreender o valor da informação é um desafio para as empresas
Próximo Texto: Investigação: Google é acusado de ter anúncio irregular
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.