São Paulo, quarta-feira, 18 de maio de 2011

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VINICIUS TORRES FREIRE

Caminho suave para baixo


Tempo começa a nublar na economia mundial, com crescimento menor e risco de tempestade na Europa


TALVEZ AS notícias sobre o andamento mais geral das economias internacional e mesmo do Brasil não se façam sentir imediatamente no cotidiano, mas o mundo anda cada vez mais devagar. Além do mais, há lombadas visíveis adiante. Para quem cuida de seus investimentos e costuma ficar na dúvida tradicional entre Bolsa e renda fixa, talvez valha a pena prestar atenção.
Ninguém pisa fundo no freio, mas as economias que nos importam mais (China, Brasil, EUA) se desaceleram, algumas inadvertida e involuntariamente, como a dos EUA.
Muito aos bocadinhos, o Brasil vai dando sinais de que não apenas, e obviamente, passou a febre de 2010 como há o risco de que o PIB cresça menos de 4%.
A inflação continuará desagradável por um bom tempo, mas não deve desgarrar além dos 6,5% de agora. Ou seja, nada de "descontrole inflacionário", a não ser na hipótese de o governo desandar a gastar de modo tresloucado.
Os EUA não se recuperaram da rateada feia no crescimento do primeiro trimestre. A produção industrial não saiu do lugar em abril e o uso da capacidade produtiva ainda segue abaixo da média dos últimos 20 anos; a construção de casas voltou a cair, assim como o número de novas licenças para construção.
O preço de commodities e recursos naturais em geral (combustíveis, minérios, comida) ainda está rateando. Em parte, óbvio, porque as perspectivas de crescimento econômico mundial são um pouco menos animadoras. Em parte porque o pessoal que ganhou dinheiro apostando (e incentivando) a alta das cotações realizou lucros, dada a ligeira retração nas expectativas de aumento da demanda.
A lombada visível adiante é o risco de calote da dívida do governo da Grécia, um assunto aparentemente esotérico, mas que pode criar transtornos que vão de uma série de pequenos pânicos nos mercados financeiros até desordens mais sérias no sistema bancário da Europa.
A Grécia está quebrada, mesmo com o empréstimo de US$ 156 bilhões que recebeu (metade do PIB deles), mesmo que faça uns US$ 70 bilhões em privatizações, mesmo que venda suas ilhas, estátuas restantes e cobre royalties pela Vitória de Samotrácia e pela Vênus de Milo.
A dívida pública grega equivale a uma vez e meia o PIB do país, o deficit público ainda anda pela casa de 9% a 10%, os juros que os gregos pagam são terminais e não caem e, para piorar, a economia encolhe. Isto é, a dívida pública ficaria relativamente maior a cada ano mesmo que o país zerasse o seu deficit.
Ou seja, não tem jeito de o país sair dessa sem alguma "reestruturação": sem adiar pagamentos (sine die?), sem reduzir o tamanho da dívida (calote puro), sem que os credores concordem com algum corte de juros (calote pianinho).
Essa arrumação da dívida grega custa sangue, suor e lágrimas aos gregos; se parte da conta cair nos bancos, haverá consequências mais gerais, dado o prejuízo da banca.
Haverá retração de empréstimos, necessidade de governos cobrirem rombos, desconfianças em relação às dívidas de Portugal, Irlanda, quiçá Espanha e Itália. Será mais um achaque de uma economia mundial (em especial no mundo rico) ainda convalescente. O tempo vai piorar. Sem furacões ou outras tempestades. Mas vai ficar nublado.

vinit@uol.com.br


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