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ANÁLISE
Nova expectativa de vida exige debate sobre aposentadoria
JOÃO BATISTA NATALI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Os bebês do sexo feminino
nascidos na França no final
da atual década deverão viver cem anos ou um pouco
mais do que isso. É algo estupendo em termos de higiene
ou sistema público de saúde.
Mas é também um pesadelo atuarial: qual será a idade
de aposentadoria dessas mulheres para não quebrar o sistema previdenciário?
Dentro da atual população
francesa como um todo, os
homens viverão 74,8 anos, e
as mulheres, 84,5.
Em termos de União Europeia, Itália, Portugal e Reino
Unido escalonaram em 35
anos a idade legal para a aposentadoria para 68 anos.
O limite de idade foi suprimido na exemplar Suécia,
onde anualmente o assalariado recebe uma simulação
de contracheque relativo a
sua idade e tempo de contribuição.
Entre os franceses, o atual
e fotogênico movimento de
protesto contra a reforma no
sistema de aposentadorias
merece duas observações.
A primeira é a mais óbvia:
as greves atingem em cheio o
setor público -SNCF, a estatal ferroviária, RATP, metrô e
trens urbanos em Paris, escolas secundárias- onde o Estado não costuma retaliar os
grevistas. Que, por sua vez,
paralisam setores que afetam
a mobilidade ou a viabilidade de assalariados que não
pretendem parar.
Mas há outro fator. Entre
os franceses, os grandes movimentos de protesto extrapolam amplamente o objetivo pelo qual foram desencadeados. É uma espécie de
operação catártica pela qual
a sociedade reitera sua fé no
Estado -ele é eficiente, e não
perdulário ou por vezes incompetente, como no Brasil- e procura moldá-lo a
seus interesses difusos.
Um exemplo não tão recente assim. Em abril de 1982
os partidários do ensino religioso privado colocaram nas
ruas de Paris 100 mil manifestantes contra a unificação,
sob tutela estatal, do sistema
de ensino.
É claro que havia nas ruas
padres, alunos de estabelecimentos privados e forças políticas conservadoras derrotadas nas presidenciais do
ano anterior.
Havia, no entanto, milhares de franceses que protestavam contra a potencial expansão do Estado em outros
setores alheios à educação.
Com relação à aposentadoria, o filme foi pela última
vez rebobinado em 1995. Jacques Chirac era o presidente
da República, e a proposta
era exigir, para o funcionalismo público, 40 anos de cotização, em lugar dos 37,5 na
época em vigor.
O extraordinário, na época, não foi a paralisação do
funcionalismo. Foi a adesão
em massa dos estudantes,
que, como hoje, não eram diretamente afetados.
Pois hoje os secundaristas
estão novamente nas ruas.
Protestam contra Sarkozy,
seu premiê e seus ministros,
para preservarem a fé na racionalidade do Estado, que
desde Napoleão 1º (1799-1814) construiu o mito de que
paira acima dos interesses
particulares.
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