São Paulo, segunda-feira, 20 de setembro de 2010

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MARIA INÊS DOLCI

Letras grandes e instruções claras


Queremos letras grandes e instruções claras para dizer sim ou não a um produto; só isso


INFORMAÇÃO é um dos direitos mais sagrados de qualquer consumidor. Direito esse muito prejudicado por expedientes como a impressão de bulas e de embalagens com letras miúdas, aquelas usadas em contratos para nos empurrar gato por lebre.
Parte do problema já foi resolvida: todas as bulas dos medicamentos fabricados a partir do ano que vem já deverão estar de acordo com as novas regras da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Isso implica que as informações terão, no mínimo, letra Times New Roman e em corpo 10.
Há também normas para o espaçamento da letras e das entrelinhas. Os fabricantes também terão de oferecer gratuitamente bulas em formatos especiais, por solicitação de portadores de deficiência visual.
Podem ser bulas digitais ou em áudio, impressas em braille ou com fonte ampliada, de acordo com as necessidades do paciente. As bulas dos pacientes devem ter perguntas e respostas para facilitar a compreensão dos leigos.
Isso está de acordo com o que dispõe o artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), segundo o qual é direito básico do consumidor "a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de qualidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem".
Ele é complementado pelo artigo 31, sobre a oferta e a apresentação de produtos e serviços.
No caso das embalagens de alimentos, de bebidas, de produtos de higiene e de limpeza, de perfumaria, entre outros, por que não adotar medidas semelhantes às que a Anvisa adotou em relação às bulas dos remédios?
Seria um avanço muito grande rumo à liberdade de escolha e à segurança e proteção à saúde dos consumidores.
Incluo nisso a necessidade de informar o preço do produto em unidades de medida, como metro, litro, quilo, para facilitar a comparação de preços, como já é adotado no Rio de Janeiro, mediante parceria da associação dos supermercados com o Ministério Público. No mês passado, projeto nesse sentido foi aprovado pela Câmara Municipal de Curitiba.
Há, além disso, um projeto na Câmara dos Deputados que, se aprovado, tornará tais informações obrigatórias em todo o país. Não será nada revolucionário, pois a correlação preço-medida foi adotada em 1998, na União Europeia, e em 2002, no Chile.
Falta, contudo, explicitar os impostos incidentes sobre os produtos e os serviços, para que saibamos o tamanho da mordida do leão da Receita Federal, com ou sem vazamento de dados nada sigilosos, pelo que estamos percebendo.
Temos de saber, com exatidão, o que estamos comprando, quais os efeitos daquele produto, quanto custa em valores comparáveis, e qual a carga tributária e fiscal embutida nele. Só assim poderemos praticar o consumo consciente, que pode ajudar o planeta a não ser destruído por seus habitantes.
Seria importante, também, que os manuais deixassem de ser livretos incompreensíveis que acompanham produtos. Para isso, teriam de ter, também, padrões mínimos de leitura. E linguagem menos técnica, com informações mais claras para facilitar a instalação, a montagem e o uso de produtos. É pedir demais?
Na verdade, nem deveria ser necessário cobrar isso. Mas a cobrança é necessária porque as empresas não tomam a iniciativa de oferecer isso a seus clientes.
Vivemos a era das redes sociais, que disseminam, em minutos, informações positivas ou negativas sobre produtos e sobre marcas. Hoje, não só a mentira, mas também a omissão, tem pernas curtas.
Não falta legislação para exigir informações precisas sobre produtos e serviços. Então, que haja cobrança e sanção para os que ainda não entenderam que o mundo mudou. Para os que continuam disfarçando restrições ou contraindicações por meio de letrinhas quase ilegíveis.
Queremos, e temos o direito, a letras grandes e a instruções claras, para dizer sim ou não a um produto. Só isso.


MARIA INÊS DOLCI, 54, advogada formada pela USP com especialização em business, é especialista em direito do consumidor e coordenadora institucional da ProTeste Associação de Consumidores. Escreve quinzenalmente, às segundas-feiras, nesta coluna.
Internet: mariainesdolci.folha.blog.uol.com.br

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