São Paulo, terça-feira, 26 de outubro de 2010

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BENJAMIN STEINBRUCH

Não dá para esperar janeiro


O próximo presidente terá de enfrentar, já a partir de segunda-feira, o complexo problema do câmbio


A CINCO DIAS do momento em que 136 milhões de brasileiros vão escolher o novo presidente da República, estão perdidas todas as esperanças de que alguns temas absolutamente relevantes sejam debatidos na atual campanha eleitoral. O eleitor vai às urnas, infelizmente, meio às cegas, sobre o caminho que os dois candidatos finalistas pretendem dar aos problemas do câmbio, da política de juros, dos gastos públicos e de desenvolvimento econômico em geral.
De todos, o problema mais aflitivo é o do câmbio. Mas, como alguns economistas costumam dizer que "mudança no câmbio não se comenta, se faz", há esperança de que o presidente a ser eleito no domingo, seja Dilma ou Serra, esteja preparado para atacar o problema a partir de segunda-feira, antes mesmo da posse, em conjunto com as atuais autoridades da área econômica.
A persistente desvalorização do dólar está longe de ser um problema exclusivo brasileiro. A moeda americana cai no mundo todo, como parte da estratégia dos EUA para recuperação de sua economia. Mas a valorização do real impõe prejuízos enormes ao Brasil. A exportação de manufaturados é a mais atingida pela perda de competitividade decorrente da queda do dólar em relação à moeda nacional. Por isso, a balança comercial dos manufaturados deve apresentar, neste ano, deficit estimado em US$ 59 bilhões.
Mantida a atual realidade cambial, esse valor pode atingir US$ 80 bilhões em 2011, com incalculáveis impactos na desindustrialização do país. Não é um valor desprezível. Representa quase um terço das reservas do país, guardadas com custos elevados, como se verá a seguir.
As reservas monetárias internacionais são um seguro importante contra crises, como ficou demonstrado em 2008 e em 2009, quando elas protegeram o país da hecatombe global. Mas o custo dessas reservas é elevado, porque para adquirir os dólares o governo precisa tomar reais emprestados no mercado interno pagando os juros mais altos do mundo, muito mais elevados do que aqueles que recebe com a aplicação das reservas no exterior. Estima-se que o custo dessa diferença entre as duas taxas de juros deva atingir R$ 50 bilhões neste ano.
Para enfrentar essa guerra cambial, portanto, o novo presidente da República terá de instar seus subordinados a usar urgentemente uma arma que o mundo inteiro está usando: os baixos juros internos.
Na semana passada, o BC manteve a taxa básica em 10,75%, um nível estratosférico considerando-se o praticado em outros países: zero a 0,25% nos EUA, zero no Japão, 2,5% na China (que aumentou a taxa em 0,25 ponto na semana passada), 5% na Índia e 7,57% na Rússia.
Note-se que em nenhum país importante, emergente ou desenvolvido, a taxa de juros sequer se aproxima da brasileira. Não é possível que o Brasil seja tão diferente a ponto de praticar taxa 1,15 vez maior que a da Índia, 3,3 vezes maior que a da China e 42 vezes superior à dos EUA.
A redução dos juros internos, portanto, é uma necessidade absoluta.
Mas a guerra do câmbio não termina aí. Na semana passada, o governo elevou pela segunda vez o IOF sobre o capital estrangeiro investido em renda fixa -a decisão também atingiu operações com derivativos.
A medida é correta e outras nessa direção podem ser necessárias antes mesmo da posse do novo presidente, mas já sob sua orientação.
Se isso não for feito, as contas externas caminharão, no médio prazo, para deficit perigosos. Neste ano, o deficit em conta-corrente deve ser de US$ 50 bilhões e, mantidas as condições atuais, pode chegar a US$ 70 bilhões em 2011. Nenhum drama no curto prazo. Dada a boa credibilidade do país, esses valores podem ser financiados com a entrada de capital estrangeiro para investimento e financiamento.
Nunca é demais, porém, lembrar a velha frase do economista Mario Henrique Simonsen: a inflação aleija e o câmbio mata. No domingo, saberemos se os brasileiros querem Dilma ou Serra na Presidência a partir de 1º de janeiro. Quem for eleito, portanto, terá de arregaçar as mangas para entrar desde já na administração do complexo problema do câmbio. E isso é só o começo.


BENJAMIN STEINBRUCH, 56, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a cada 15 dias, nesta coluna.
bvictoria@psi.com.br

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Alexandre Schwartsman


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