São Paulo, quarta-feira, 26 de outubro de 2011

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VINICIUS TORRES FREIRE

Importação de vexames


Impostaço sobre carros importados rende derrotas para o governo, que pode modificar o decreto do IPI


O IMPOSTAÇO sobre carros "sem conteúdo nacional mínimo", o IPI extra sobre os importados, não tem rendido mais que reveses, perdas de tempo e vexames para o governo de Dilma Rousseff. Não suscitou aplauso político além do lobby das montadoras já instaladas aqui, de alguns industriais interessadamente solidários e de uns raros defensores teóricos do protecionismo nu e cru.
Mas os economistas de Dilma o defendiam como se tratasse de questão de princípio e programa, quando na verdade o decreto do imposto não passava de medida "ad hoc", que brotou das ideias gelatinosas que passam por política industrial no governo. Agora, pressionado por derrotas e evidências do disparate pragmático da iniciativa, pensa-se em reformá-lo.
O que se vai fazer? Pode sair um alívio para montadoras de marcas ora importadas que planejam se instalar aqui. Isto é, poderia haver um prazo de carência para que tais empresas apresentassem carros com um "conteúdo nacional mínimo". Podem ser exigidas contrapartidas das montadoras "nacionais" (múltis que se tornaram "nacionais" por, digamos, usucapião: as que estão aqui faz mais tempo).
Lembre-se de que, na política industrial anunciada semanas antes do impostaço, pretendia-se oferecer isenção fiscal para as montadoras "nacionais" desde que as empresas melhorassem a tecnologia de seus produtos. O lobby das montadoras transformou esse pão já meio amanhecido em pedra protecionista.
Se vier a mudança do decreto, será preciso esperar mais 90 dias para que as novas alíquotas sejam cobradas. Logo, o impostaço ou seu substituto entraria em vigor lá por 2012. Tanto barulho ainda por quê?
Desde que o governo apareceu com essa história, colecionou derrotas e, enfim, por ora a tática protecionista é contraproducente. Houve derrota político-jurídica. A vigência imediata do impostaço caiu no Supremo, devido a uma ação do DEM. O imposto, como parece dizer a Constituição, só poderia ser cobrado após 90 dias de decretado.
Houve o vexame de imagem. Neste outubro, as montadoras "nacionais" começaram a anunciar programas de demissão voluntária, que costumam ser prévias de programas de demissões impostas mesmo. Decerto o câmbio desfavorável e malandragens comerciais de países da Ásia ajudaram a derrubar as vendas da indústria brasileira (e não apenas as de automóveis, claro).
Mas um dos motivos do esfriamento do mercado de carros foi a própria e, no caso, correta política econômica do governo (no caso do Banco Central): era preciso conter o consumo, dada a inflação. Enfim, a venda de carros importados aumentou, dada a perspectiva de aumento de imposto e preços.
Houve ainda o vexame no debate do comércio internacional. O Brasil vinha lançando a mão da carta de crítico do protecionismo. De repente, aparece com uma medida de proteção mambembe e canhestra.
Houve, por fim, o vexame "teórico". Mesmo entre adeptos ponderados de medidas de proteção comercial ou de política industrial, defende-se a ideia de exigir contrapartidas tais como melhoria do produto e aumento de produtividade em um prazo estipulado, depois do qual as empresas deveriam ser capazes de competir no mercado mundial -e não de pedir mais favores.

vinit@uol.com.br


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