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OPINIÃO
Decisão ilude os poupadores e leva alegria aos banqueiros
MARIA INÊS DOLCI
COLUNISTA DA FOLHA
Quem se lembra da época
em que a inflação escapava a
qualquer tentativa de controle? Os índices mensais na casa dos dois dígitos desafiavam os governos, que lançavam pacotes econômicos
quando o cenário político ficava insustentável.
Foi dessa forja que saíram
os planos Bresser, Verão e
Collor 1 e 2. A herança desses
"pacotes", como eram chamados, ficou nas perdas salariais e nos valores depositados em poupança.
O Superior Tribunal de
Justiça (STJ) julgou na quarta-feira dois recursos contra
o ABN Amro Real e a Caixa
Econômica Federal.
E decidiu contra os poupadores, o que configurou uma
derrota dos direitos dos consumidores afetados por medidas unilaterais de governos, como ocorreu naqueles
planos econômicos.
Para piorar, o STJ disfarçou sua malvadeza sob o
manto da aparente bondade.
Sim, porque a sentença
deu ganho de causa aos poupadores. Definiu reajustes de
26,06% para as poupanças
lesadas pelo Plano Bresser,
de 42,72% para as do Plano
Verão, de 44,80% para as
afetadas pelo Plano Collor 1 e
de 21,87% para as do Plano
Collor 2.
Muito bom, não? O truque
foi inserir um filtro, reduzindo o prazo de prescrição das
ações coletivas de 20 para 5
anos. Para as ações individuais, manteve os 20 anos.
Com uma tacada só, alijou
praticamente todas as ações
coletivas, que representam
99% do total de 70 milhões
de contas que fariam jus aos
reajustes.
De quebra, o STJ padronizou decisão de abril, em favor da prescrição após cinco
anos. Um golpe de mestre
que pareceu beneficiar os
consumidores. E que, na verdade, fez o que as instituições financeiras queriam.
Como na antiga propaganda,
parece, mas não é.
Se tivesse aceitado a tese
dos poupadores, o STJ teria
enviado um sinal claro aos
governos de que não poderiam fazer o que bem entendem, atropelando direitos e a
própria legislação.
Foi uma oportunidade
perdida, cujas consequências negativas vão além do
que os poupadores deixarão
de receber. O uso de pacotes
econômicos, geralmente
anunciados à meia-noite para dificultar reações das pessoas, marcou negativamente
o regime autoritário e o começo da redemocratização.
O sucesso do Plano Real
em debelar os índices inflacionários apagou essa memória dos brasileiros nos últimos 16 anos. Já há jovens
que nem fazem ideia do que
era correr para as compras ao
receber o salário, antes que
este se liquefizesse, corroído
pela carestia.
Os cidadãos com mais de
30 anos, contudo, viveram e
sofreram naquele período.
Milhões foram lesados pelos
pacotes malsucedidos, e agora esperavam boas notícias
da Justiça. No Brasil, porém,
as boas notícias costumam
frequentar mais os endereços
das instituições financeiras.
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