São Paulo, quarta-feira, 27 de outubro de 2010

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ANÁLISE

Ajuste fiscal opõe teoria econômica e prática política

GUSTAVO PATU
DE BRASÍLIA

Considerada "um equívoco" por Guido Mantega (Fazenda), a proposta de cortar os gastos do governo para conter a queda do dólar tem amparo na teoria econômica, embora seja menos palpável na prática política.
Despesas públicas em geral, as brasileiras em particular, são combustível para o consumo. Em crescimento constante -e concentradas em salários, aposentadorias e benefícios assistenciais-, contribuem para que o BC mantenha juros altos para frear as compras e os preços.
Com os juros entre os mais elevados do mundo, o país atrai uma enxurrada de capital externo interessado em ganhos no mercado financeiro, além do desejado investimento externo no setor produtivo. Em sobra, o dólar cai, com prejuízo para a exportação, a indústria e o emprego.
Um endurecimento da política fiscal, portanto, ajudaria o BC a controlar o ritmo do crescimento da economia sem necessidade de taxas anômalas na política monetária. A experiência concreta, aliás, comprova a queda dos juros, ainda que com idas e vindas, desde o início do programa de ajuste das contas públicas, em 1999.
Como vantagem extra, ficariam mais baratas as operações oficiais de compra de dólar para evitar uma queda ainda mais acentuada das cotações. Hoje, o governo se endivida a juros domésticos para intervir, enquanto as reservas cambiais obtidas têm a rentabilidade minúscula das taxas internacionais.

SUPERAVIT
Mais difícil, no entanto, é imaginar as dimensões do corte de gastos necessário para os resultados desejados, ainda mais quando nem sequer é cumprida, desde 2009, a meta de superavit primário -a poupança de parte das receitas para o abatimento da dívida pública-, de 3,3% do PIB.
Mesmo com superavit recordes mantidos até 2008, que superaram os 4% do PIB, os juros brasileiros não chegaram a cair aos patamares tidos como civilizados. Cada ponto percentual, nessa conta, significa R$ 35 bilhões anuais, quatro vezes o que o governo gastará em 2011 apenas para corrigir o valor do salário mínimo pela inflação.
Se a viabilidade técnica e política da empreitada é duvidosa, seus efeitos sobre a taxa de câmbio tampouco são menos incertos. Afinal, o diferencial de juros internos e externos não é a única razão para a derrocada do dólar -presente também nos países onde a política fiscal colabora com a monetária.


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