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ANÁLISE CAFÉ
Parceria entre produtores e iniciativa privada proporciona ganhos coletivos
SYLVIA SAES
ESPECIAL PARA FOLHA
Nos últimos 20 anos, a
qualidade do café brasileiro
melhorou significativamente. A disseminação de boas
práticas, na colheita e na secagem, é o principal componente desse resultado.
Mudanças nas práticas
dos produtores, porém, não
ocorrem de uma hora para
outra. Ainda que a demanda
sinalize uma preferência por
maior qualidade, não é fácil
para o cafeicultor identificar
e apostar nessa mudança.
Em primeiro lugar, porque
isso acarreta mais trabalho e
a incerteza de ganhos futuros. Além disso, o poderoso
incentivo fornecido pelos
preços é frequentemente
capturado pelos elos intermediários da cadeia.
O que explica o progressivo investimento em qualidade do produto? Existe algum
modelo que nos forneça lições?
Para entender a nova realidade, é necessário voltar ao
início da década de 90, época
da pior queda de preços desde a crise dos anos 1930.
Em meio a uma difícil situação no mercado, muitos
cafeicultores se viram estimulados a correr riscos, entrando em um novo nicho de
mercado. A maior demanda
por cafés especiais nos países do hemisfério Norte foi a
oportunidade para o início
da transformação.
A década de 90 foi também
a época do ressurgimento do
interesse pelo potencial do
café brasileiro. A desregulamentação do mercado internacional, aliada ao interesse
das empresas de café especial em garantir o suprimento de matéria-prima de qualidade, resultou em uma reestruturação do relacionamento entre parte dos cafeicultores e a iniciativa privada.
Mais especificamente, o
que se viu foi a aproximação
entre a iniciativa privada e
esses produtores em um esforço real de entendimento
das condições que garantiriam a qualidade exigida pelo mercado. Treinamentos
específicos forneceram as
ferramentas necessárias para a gestão do negócio, aproximando também os órgãos
de pesquisa especializados.
Desde então, esse movimento ganhou corpo, sendo
liderado pela ação de uma
torrefadora italiana. A disseminação dos concursos de
qualidade pelo país, ao recompensar as boas práticas,
teve importante efeito didático sobre os cafeicultores.
DIÁLOGO
O êxito desse modelo se
deve à natureza da parceria
estabelecida pela iniciativa
privada, pautada pelo diálogo constante com os cafeicultores.
Da mesma forma, a aproximação dos órgãos de pesquisa do cotidiano da atividade
reforça, entre os produtores,
a necessidade de aplicação
do conhecimento técnico para a obtenção de melhores resultados.
Assim, é importante salientar a centralidade dos
produtores para o bom funcionamento da cadeia. Maior
atenção aos seus anseios,
nesse sentido, deve acarretar
políticas consistentes, e não
apenas ações de marketing.
A identificação das preferências do consumidor, em
um modelo que valoriza o conhecimento científico, é fundamental. Mais importante é
estabelecer um modelo de relacionamento entre os agentes que possa se sustentar no
longo prazo.
A "asfixia" do segmento
produtor, na busca por maiores lucros, ou a adoção de
modelos utópicos de gestão
somente contribui para disseminar a insatisfação, o
que, na prática, significa menores incentivos para a diferenciação. Compartilhar valor deve ser uma estratégia
real e não só de marketing.
SYLVIA SAES é professora do
Departamento de Administração da
Faculdade de Economia, Administração e
Contabilidade da Universidade de São
Paulo (FEA-USP).
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