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Folha Transparência

Suriname causou atrito entre Brasil e EUA

Telegramas revelam que Itamaraty se opôs a plano de 'união de nações' com Holanda, apoiado pelos americanos

Para governo brasileiro, projeto feria soberania; EUA, por sua vez, viam proximidade do Brasil com militares golpistas

RUBENS VALENTE
FERNANDA ODILLA
DE BRASÍLIA

O Brasil se opôs fortemente a plano lançado pela Holanda e apoiado pelos EUA nos anos 90 para obrigar o Suriname a mudar seu sistema político em troca de apoio financeiro. O Itamaraty viu no plano tentativa de "ingerência" e "nova colonização".

Em contrapartida, os EUA cobraram do Brasil explicações sobre venda de armas para o Suriname e pediram que o país revisse seu treinamento militar para os líderes do Exército do país vizinho.

Esse foco de tensão diplomática é registrado em inúmeros telegramas confidenciais do Itamaraty e da Embaixada do Brasil em Washington (EUA), obtidos pela Folha após pedido ao Ministério das Relações Exteriores.

O projeto "Folha Transparência" põe no ar hoje 37 telegramas inéditos, elevando para 1.659 o total de documentos liberados na internet.

Em janeiro de 1991, um mês após golpe militar que derrubou o governo civil no Suriname, os telegramas revelam que a Holanda estava prestes a aplicar no país, com apoio dos EUA, o Plano Lubbers.

O projeto previa uma "união de nações", incluindo mercado comum, entre a Holanda, sua ex-colônia e duas ilhas do Caribe. Mas as contrapartidas exigidas pelos holandeses incluíam mudanças no sistema político que, para o Brasil, agrediam a soberania surinamesa.

Publicamente, o Brasil, presidido na época por Fernando Collor, ficou em silêncio -mas os telegramas agora revelados mostram que o país enviou aos EUA e à Holanda várias objeções.

Em junho de 1991, o embaixador brasileiro em Washington foi orientado a dizer aos EUA e à Holanda que o país via "com extrema preocupação qualquer tentativa de reduzir ou qualificar a soberania plena do Suriname".

Meses antes, o Itamaraty recebera telegrama confidencial de sua embaixada no país vizinho: "Avança a passos largos o Plano Lubbers, e a reversão do Suriname a status semicolonial é a cada dia possibilidade mais concreta".

Os EUA, por sua vez, se diziam incomodados com a proximidade entre o Brasil e militares golpistas do Suriname. O então secretário de Estado dos EUA, James Baker, enviou uma carta ao então chanceler brasileiro, Francisco Rezek, para pedir que o Brasil mudasse sua política de dar treinamento militar a líderes do Exército do país.

Políticos do Suriname e da Holanda também contestaram o Plano Lubbers, que acabou não saindo do papel.

Neste ano, documentos revelados na Europa sugerem que as preocupações do Brasil faziam sentido: segundo indicam esses papéis, a Holanda montou um plano, não levado a efeito, para invadir o Suriname em 1986. Em 1992, os EUA voltaram a cobrar que o Brasil se afastasse dos militares surinameses.

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