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Clóvis Rossi

Da inutilidade das cúpulas

Seja em meio ambiente ou na economia, a capacidade de ação dos governos parece que tende a zero

Há alguns anos, quando as reuniões sobre comércio internacional ainda suscitavam emoções, Guy de Jonquières, então editor de comércio do "Financial Times", produziu uma peça jornalística só possível a partir do humor britânico. Dizia Guy que os negociadores davam a nítida sensação de que se reúnem não para decidir alguma coisa mas pelo prazer de se reunir.

A negociação seria um fim em si mesmo, e não a busca de um resultado.

As mais recentes reuniões internacionais dão razão a Guy. No caso do encontro de Durban sobre meio ambiente, os negociadores foram ao exagero de promover a mais longa negociação de todos os tempos, ultrapassando em um dia e pouco o prazo-limite.

Resultado: apenas "permanecer vivo para lutar no outro dia", na avaliação de Bernice Lee, diretora de Pesquisa em Energia e Meio Ambiente da Chatham House, respeitado centro de estudos britânico.

Ou, no texto de Claudio Angelo, o especialista da Folha enviado a Durban: "O texto de uma página e meia batizado de 'Plataforma de Durban' (...) estabelece um calendário para criar 'um protocolo, outro instrumento legal ou um resultado acordado com força legal' em 2015 que possa entrar em vigor até 2020".

Em outras palavras, os negociadores não conseguiram dizer a que animal, afinal, darão cria, assim mesmo dentro de quatro anos, para valer só mais cinco anos depois, enquanto o planeta derrete.

É bom lembrar que a grande cúpula do clima foi há dois anos, em Copenhague, que terminou não aprovando nada realmente relevante. Na preparação para essa reunião, todo o mundo -com exceção dos negacionistas da mudança climática- dizia que era a cúpula que evitaria o fim do mundo. Talvez tivessem razão: como a Folha mostrou ontem, a concentração de CO2 em partes por milhão subiu de 387,4 da época de Copenhague para mais de 400 na hora do encontro em Durban.

Como Durban tampouco tomou decisões para o futuro imediato, torna-se razoável o alarmismo demonstrado por ONGs como Christian Aid e Oxfam, que acham que jogar para 2020 a implementação de um acordo para cortar emissões equivale a aceitar que a temperatura do planeta suba 4 graus acima dos níveis pré-era industrial, o dobro do que se considera o limiar do fim do mundo.

Por falar em fim do mundo, era esse o, digamos, apelido da cúpula europeia de sexta-feira, que deveria evitar o colapso do euro.

Qual foi o resultado? Um acordo sobre o necessário (a coordenação fiscal entre os países da eurozona) que, no entanto, não toca nem no urgente nem no essencial, como lembra, para "El País", Manuel de la Rocha Vázquez, coordenador de Economia Internacional da Fundação Alternativas:

"A atenção ao urgente [estabilizar os mercados financeiros e assegurar o futuro do euro] não deve fazer esquecer o importante: recuperar o crescimento." Só com o crescimento, como é óbvio, se recupera também o emprego.

O pior é que nem o urgente está sendo conseguido, a julgar pela reação dos mercados. Fica a nítida sensação de que a natureza e os mercados superam, de longe, a capacidade de ação dos governos.

crossi@uol.com.br

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Roberto Abdenur

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