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Clóvis Rossi

Protesto dá capa. E agora?

Manifestantes precisam sair da praça para reinventar a política. Ou não terão futuro

A capa da revista "Time" desta semana é belíssima graficamente: mostra o rosto semi-coberto da "pessoa do ano", o "protester", esse pessoal que, como diz o texto, ocupou praças de Wall Street a Moscou, passando, claro, por Atenas, pela Primavera Árabe, por Madri.

A escolha é justa, por pouco que eu leve a sério esse tipo de seleção, pelo arbítrio que inexoravelmente a caracteriza.

O problema começa com a justificativa para a escolha: "Em 2011, os que protestavam não apenas expressaram suas queixas; eles mudaram o mundo", diz a "Time".

É no mínimo prematuro fazer tal afirmação.

Mudaram, é verdade, regimes ditatoriais no Egito, na Tunísia e na Líbia, obtiveram reformas tímidas mas promissoras no Marrocos e uma promessa de saída do ditador do Iêmen. Ótimo. Justifica ganhar a capa pelo presente, mas o futuro é questão em aberto.

Afinal, os movimentos vencedores das eleições na Tunísia e no Egito não foram exatamente os filhos diretos dos protestos, mas os bem estabelecidos grupos islamitas, ainda que clandestinos. Nada contra.

Concordo com Ed Husain, especialista do Council on Foreign Relations, quando diz que não há legitimidade sem levar em conta a Irmandade Muçulmana -o grupo-mãe de todos os partidos islamitas vitoriosos até agora, onde houve eleições.

Daí até a achar que um partido criado em 1928 possa de fato representar o grito pela mudança que foi o foco dos protestos vai uma distância que não dá para percorrer por enquanto.

Além disso, permanece o fato de que, se no mundo árabe, os protestos foram eficazes, no Ocidente, não mudou nada. Wall Street -cuja ocupação ajudou os "protesters" a ganhar a mídia norte-americana- continua mandando no mundo, do que dá prova, todos os dias, a crise europeia.

Um dos combustíveis principais dos protestos, o desemprego, não mudou. Ou melhor, mudou para pior: era de 7,7% na eurozona quando começou a crise e passou a ser, em outubro, de 10,3% (16,29 milhões de pessoas), o índice mais alto desde o início da encrenca.

Para que os donos da capa possam de fato mudar o mundo precisarão reinventar a política. Ocupar as praças é uma maneira eficaz de chamar a atenção e de pôr o dedo na ferida dos problemas, mas atacá-los exige uma atuação que os partidos políticos existentes não parecem nem dispostos nem capacitados a exercer.

Tome-se, por exemplo, o caso da Grécia. Os "aganaktismeni", versão local dos indignados, fizeram um e mil protestos, ocuparam a Syntagma, a praça principal, em frente ao Parlamento, engrossaram um punhado de greves com maciço acatamento, mas não foi minimamente afrouxado o aperto que levou a aumento de 40% no número de suicídios.

Idem para a Espanha, o país em que os "indignados" parecem ter reunido números mais expressivos. Mas a indignação não influiu no resultado eleitoral, que deu a vitória a um partido ainda mais disposto a fazer os ajustes que estiveram na origem dos protestos.

Falta muito, portanto, para que os "protesters" mereçam outra capa, em 2012, 13 ou seja lá quando for.

crossi@uol.com.br

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Moisés Naím

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