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Análise Europa

Crise põe em risco balanço político europeu

Alemanha se vê pressionada pelo público interno e pela chance de afirmar sua política sem pegar em armas

Novos governos em Roma e Atenas foram impostos por Bruxelas na sua queda de braço com os mercados

IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A desestabilização do projeto de integração europeia, decorrente da crise financeira, está movimentando placas tectônicas políticas em todos os cantos do continente.

O centro de tudo é a Alemanha, a líder econômica e demográfica, indutora do euro e, agora, da agenda recessiva que pode salvar ou desmantelar a União Europeia como a conhecemos atualmente.

Não é novidade. No começo do século 19, foi o reino alemão da Prússia que preconizou um grande projeto supranacional: o "Zollverein", a união aduaneira de países germânicos.

É exagero temerário fazer paralelos com o euro, mas o ponto é que uma iniciativa econômica serviu a um propósito político maior, que foi a consolidação do império alemão em 1871 -que humilhou os franceses e desafiou depois o poderio britânico, lançando as bases para a conflito mundial de 1914.

A sabedoria convencional defende que o nacionalismo prussiano empurraria a Europa para a servidão, como o nazismo fez ao vingar-se da derrota de 1918.

Não é por acaso que a mídia mais exaltada na França e também no Reino Unido ressuscita personagens históricos e apelidos dos tempos de guerra.

Outra linha da historiografia acredita que os alemães de 1914, se bem-sucedidos, teriam na verdade formado um núcleo muito semelhante ao que hoje é a União Europeia.

Voltando para 2011, a Alemanha agora se vê pressionada pelo público interno, que supõe estar pagando uma conta alheia, e pela oportunidade histórica de afirmar sua receita política sem ter de pegar em armas.

Os franceses, que dividem a liderança política da União Europeia com os alemães, chancelaram as exigências de Angela Merkel, na esperança de salvar a moeda comum e para que Sarkozy saia bem na foto de uma eleição que está quase perdida.

Os britânicos fizeram o que se esperava do mais "eurocético" dos membros da UE, sempre crítico da moeda única. A primazia da City nas finanças europeias seria contestada pelo pacote alemão.

O premiê David Cameron pode até cair e Frankfurt levar a melhor sobre Londres, mas até aqui a história fez justiça aos britânicos.

Enquanto isso, toda a chamada periferia do euro prepara-se para mais convulsões sociais devido às exigências fiscais draconianas, e os críticos do plano alemão veem risco de quebradeira generalizada pelo continente.

Novos governos em Roma e Atenas foram impostos por Bruxelas na sua queda de braço com os mercados.

Em Lisboa, os cartazes nas ruas há muito ultrapassaram a cantilena anticapitalista, representando críticas da mais preparada geração do país. Greves e protestos prometem ser uma constante nas economias maiores.

E há mais. Um país central para a estratégia de defesa ocidental, a Turquia, arrefeceu seu ímpeto europeu, de resto sempre esnobado pela França. Olha para outros mercados: investimentos turcos são dominantes em locais como Bagdá e Cabul.

Os antigos países da esfera soviética, que namoravam a ideia europeia, também sofrem abalos. A Ucrânia, sempre na mira da UE, acaba de atrelar-se muito à Rússia em um acordo energético. E mais vem pela frente.

Por fim, um fracasso europeu deixa em maus lençóis ex-soviéticos como a Geórgia, que perdeu uma guerra com a Rússia e a chance de integrar-se ao sistema militar ocidental em 2008.

Assim, a Europa chega a 2011 mais ou menos como esteve ao longo de sua história recente: com seu destino ligado ao da Alemanha.

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