Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Mundo

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Devoção a Chávez surpreende escritores

Preço baixo de livros e disparates econômicos chamam a atenção de autores brasileiros em visita a evento em Caracas

Três representantes do país participaram de feira do livro na Venezuela, que vive uma onda de protestos

FABIANO MAISONNAVE DE SÃO PAULO

Alice Sant'Anna viu um protesto contra a venda de obras do escritor peruano Mario Vargas Llosa, feroz crítico do governo venezuelano. Fabiano Calixto se animou com o "povo" carregando sacolas repletas de livros. E Cristino Wapichana estranhou a cidade coberta por imagens do ex-presidente Hugo Chávez, morto no ano passado.

Em meio aos protestos e à crise econômica que assolam a Venezuela, os três escritores participaram dias atrás da 10ª Feira Internacional de Livro em Caracas como representantes do Brasil, o convidado de honra deste ano.

Em relatos à Folha, contaram suas impressões sobre sua primeira visita à capital do país que está em convulsão por conta de conflitos entre o governo do presidente Nicolás Maduro e a oposição.

"Lá, eles falam de política o tempo todo. É o único assunto possível", contou a poeta carioca Sant'Anna, 26.

"Participei de um recital só com mulheres, das quais três eram venezuelanas. Na última rodada, uma delas leu, emocionada, um poema pró- Chávez. Em seguida, a outra leu também um poema para o Chávez. Eram poemas inflamados. Achei estranho, porque nunca vi, no Brasil, alguém lendo um poema para um político."

De acordo com Sant'Anna, um dos seus anfitriões caracterizou a oposição no país de "nazista". Ela elogiou o preço baixíssimo dos livros, mas ressaltou: "o governo só publica quem fala bem do governo".

Uma cena chamou a atenção da escritora. Em um estande que vendia obras de Vargas Llosa, conta ela, "fizeram um microprotesto até tirarem os livros dele".

Já o pernambucano Calixto, 41, disse que foi a Caracas "cheio de expectativas boas. E todas se cumpriram."

"A feira do livro é fantástica. É uma feira onde o povo está presente, pode sair de lá com sacolas grandes de livros. Onde a ideia clássica de feira (editoras cultivando o turbocapitalismo, só pensando na leitura dos cifrões em códigos de barra) vai por água abaixo", afirmou.

"A leitura, o investimento em leitura, em educação, é pesado. Eles estão no caminho certo", escreveu, via e-mail.

Ele afirma que conhecer --ainda que superficialmente-- a Venezuela fortaleceu suas convicções: "Para usar uma expressão do Vitor Ramil, eles não estão à margem da história, mas no centro de outra. E é por essa história que uma parte do mundo (os humanistas) luta. Minha admiração por Chávez era grande, tornou-se ainda maior."

Embora seja de Roraima, que divide fronteira com a Venezuela, o escritor indígena Cristino Wapichana, 42, também nunca tinha ido a Caracas. Ele conta que se surpreendeu com a devoção ao "comandante".

"Caracas tem muita cara do Chávez: bandeiras, fotos, muito sobre ele", disse, por telefone. "Como estamos acostumados a um país democrático, achei estranho. Por outro lado, muitos escritores publicam pelo governo. Só não é comercial, tem um valor muito baixo."

Wapichana ficou surpreso com os "disparates" da economia, resultado da inflação alta e do câmbio fora de controle. "Conheci uma moça que paga 20 bolívares (R$2) por um semestre de faculdade. Mas o refrigerante custa 25 bolívares."

O escritor ressaltou o grande número de escritoras mulheres. "No Brasil, 90% dos escritores são homens. Na Venezuela, é o contrário."


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página