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'Governo e Clarín são culpados por crise'

Para Jorge Fontevecchia, um dos maiores empresários da mídia argentina, é preciso mais pluralidade na imprensa

Dono do Grupo Perfil, ele acusa o governo de não cumprir decisão da Justiça sobre forma de distribuir publicidade

SYLVIA COLOMBO
DE BUENOS AIRES

Fundador e proprietário do Grupo Perfil, um dos principais de mídia da Argentina, Jorge Fontevecchia, 56, diz que a atitude do governo Cristina Kirchner contra a imprensa que lhe é crítica tem sido abusiva.

O executivo, porém, defende que é necessário rever os benefícios dados pelos Kirchner ao Grupo Clarín no passado, antes que a guerra entre o governo e a imprensa começasse.

O Grupo Perfil, crítico ao governo, edita o jornal "Perfil", a revista "Caras" e a "Noticias" -esta, a principal revista semanal do país.

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Folha - O que o sr. achou da operação policial contra a Cablevisión [do "Clarín]?
Jorge Fontevecchia - A fusão da Cablevisión com a Multicanal fez com que a empresa virasse um virtual monopólio de acesso à TV na cidade de Buenos Aires, onde se concentram 80% da publicidade e da produção de conteúdos da Argentina.
O ex-presidente Néstor Kirchner permitiu a fusão quando era amigo do "Clarín". Tanto o governo como o "Clarín" são culpados desta realidade.

O que acontecerá caso a lei que considera o papel um insumo de interesse nacional seja realmente aprovada?
"Clarín" e "La Nación" se abastecem de 90% de sua produção na Papel Prensa [empresa que Cristina pretende controlar] e importam 10%. Há uma quantidade de pessoas que gostaria de comprar papel da empresa. Então o Estado diz: vamos investir para aumentar a produção da Papel Prensa.
A falácia aqui é a seguinte: o papel importado hoje sai 10% mais barato do que o papel que vende a Papel Prensa. Então como será possível que todos comprem da Papel Prensa, e mais barato?
Só podemos concluir que o próximo passo do governo será proibir a importação.

O "Perfil" ganhou uma causa na Justiça obrigando o governo a anunciar nas suas publicações.
Sim, há uma decisão judicial, mas o governo não está cumprindo.
A Suprema Corte ordena toda semana que se cumpra e o governo não o faz. O "Perfil" é a única empresa na Argentina que, durante esses nove anos de kirchnerismo, nunca teve publicidade oficial.
Nos primeiros anos, o "Clarín" e o "La Nación" não criticavam o governo. O "Clarín" foi beneficiado. E o "La Nación" teve uma atitude cautelosa. Quando a crise econômica era muito séria, o único jornal crítico era o "Perfil".

Qual sua avaliação sobre a Lei de Meios [que busca reduzir o tamanho das empresas]?
Creio que é correto que deva haver maior pluralidade nos meios. O tamanho do "Clarín" é excessivo e um problema para o bom exercício do jornalismo. Para comparar com Brasil, o Grupo Clarín corresponderia ao poder da TV Globo, mais a Folha, mais o jornal "O Globo" e o UOL, sem contar o serviço de banda larga.

Então o sr. concorda com o termo "monopólio"?
Não, não é um monopólio, em todas as atividades tem posição dominante, mas não é monopólio. A fusão de Cablevisión e Multicanal não deveria ter sido permitida, e quem a permitiu foi Néstor Kirchner (1950-2010).
Esse governo é especialista em empreender boas obras com más intenções. Os fins são nobres, mas são utilizados para outra coisa.

A Argentina, em matéria de controle da imprensa pelo governo, pode se aproximar da Venezuela e do Equador?
Não, creio que, em nível cultural e cívico, a Argentina é superior a Equador e Venezuela. Abusos de lá não aconteceram aqui ainda. E não acredito que aconteçam.
Aqui não houve até agora ninguém que tenha perdido sua licença de rádio e televisão como aconteceu na Venezuela. Não houve, como no Equador, uma decisão judicial que fizesse que o diretor de um jornal tivesse que fugir do país e pagar uma multa por um artigo contra o presidente Correa. E não creio que vá acontecer no futuro.

Como entender os 54% de votos a Cristina, uma vez que o Clarín, que lhe faz oposição, é tão influente?
Aí é preciso entender quem consome jornalismo na Argentina. A parte mais instruída da população, como no Brasil.
Os consumidores de imprensa escrita são parte pequena, mas para os políticos é importante porque é o espelho onde se veem.
Cristina olha os jornais todos os dias como a um espelho, e esse espelho lhe diz que ela não é a mais linda. O efeito que produz é muito maior.

Cristina lê os jornais, mesmo os opositores?
Ela lê tudo. Os jornais, vê noticiários na TV, para os políticos a importância que tem o Grupo Clarín é muito maior que a que tem a Globo. Além disso, o leitor argentino é muito mais politizado do que o brasileiro.
Quiçá seja difícil para um brasileiro entender a importância que a política ocupa por aqui. Mas basta dizer que é mais importante que o futebol. Entendo quando os brasileiros perguntam, o que acontece com os argentinos e a política, por que tanta paixão? A política ocupa um espaço muito importante, é uma característica histórica e cultural.

FOLHA.com
Leia a íntegra
www.folha.com/no1024716

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