Decisão dos jurados é norma, não exceção
Para Justiça dos EUA, uso da força deve ser avaliado segundo visão do policial no momento, não após fato ocorrido
Segundo advogada, percepção do agente sobre o perigo que corre pode ser influenciada pela raça do suspeito
A decisão do júri de não indiciar o policial Darren Wilson transforma este caso no mais recente da longa lista em que policiais atiraram em suspeitos. Mostra ainda a amplitude da lei e dos tribunais em relação a policiais que fazem uso de força letal.
Para o júri, a questão nunca foi decidir se Wilson, branco, matou a tiros o negro desarmado Michael Brown. Foi decidir se o incidente constituiu um crime.
Ao negar-se a indiciar o agente, o júri chegou a uma conclusão que é muito mais a norma do que uma exceção.
"É raríssimo um policial ser indiciado e, especialmente, condenado por um crime nesse tipo de situação", disse Chuck Drago, consultor de práticas policiais e ex-chefe de polícia de Oviedo, Flórida.
Os Estados e os departamentos de polícia definem suas próprias políticas de ação, que geralmente autorizam os agentes a usar a força quando temem ser vítimas de ataque físico iminente.
A Suprema Corte moldou o padrão dos EUA em uma decisão de 1989. Segundo ela, o uso da força deve ser avaliado "pela visão de um policial razoável no local e no momento", e não julgado após o fato ocorrido.
Assim, promotores e jurados relutam em questionar as decisões dos policiais e em geral dão o benefício da dúvida.
Muitos dos casos que não terminam em indiciamento criminal envolvem suspeitos armados que são baleados em confronto com a polícia.
Mas mesmo um policial que dispara várias vezes contra uma pessoa desarmada, como em Ferguson, pode evitar ir a julgamento se afirmar que corria risco iminente.
Apesar de a polícia poder usar força letal, a advogada Lori Lightfoot, de Chicago, disse que a percepção que o policial tem do perigo pode ser fortemente influenciada pela raça do suspeito.
Isso acontece especialmente em uma comunidade como Ferguson, onde uma polícia de maioria avassaladora branca patrulha uma cidade de maioria negra.
"É o caso de qualquer ambiente em que se vive: se não há diversidade no local de trabalho das pessoas, há uma lacuna em sua experiência de vida", disse a advogada.
Os tiros em Ferguson foram disparados após uma escaramuça que começou quando o policial Wilson mandou Brown e um amigo saírem da rua e irem para a calçada.
O promotor público do condado de Saint Louis, Robert McCulloch, disse que os dois homens se engalfinharam dentro do carro dirigido por Wilson e que o policial deu vários tiros em Brown depois de ser atacado.
Ao explicar a decisão do grande júri, McCulloch citou o que afirmou serem relatos inconsistentes e errôneos das testemunhas.
O Departamento de Justiça continua a investigar o caso para verificar evidências de uma potencial violação de direitos civis, e investigadores federais estão se baseando nas mesmas provas e depoimentos de testemunhas usados pelo grande júri.
Mas eles terão que contar com provas mais consistentes para definir se Wilson privou Brown intencionalmente de seus direitos civis.
Esse padrão de evidências tem sido difícil de atender em casos destacados anteriores.