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O Haiti quer ser aqui

Haitianos que emigram para o Brasil sonham em viver em São Paulo e ajudar a construir o Itaquerão

Gabo Morales/Folhapress
Eliana Surin, 22, que vive no Brasil há quatro meses, na Casa do Migrante, em São Paulo.
Eliana Surin, 22, que vive no Brasil há quatro meses, na Casa do Migrante, em São Paulo.

AGUIRRE TALENTO
Enviado especial a Rio Branco (AC) e Porto Velho (RO)
BRUNO MOLINERO
MATEUS LUIZ DE SOUZA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Mesmo sem conhecer qualquer palavra em português, o haitiano Jean Francat Carièce, 31, decidiu migrar para o Brasil. "Vim com uma mala, R$ 50 na carteira e uma certeza: trabalhar em São Paulo. Dizem que existe muito trabalho por lá."

Assim como Carièce, grande parte dos haitianos que aguardam por um visto nos municípios de Tabatinga (AM) e Brasileia (AC) tem como objetivo trabalhar na capital paulista.

"O estádio da Copa do Mundo em São Paulo já foi construído? Dizem que estão precisando de muitos pedreiros, é verdade?", pergunta Don Pharisien, 22. Locutor profissional em Porto Príncipe e aficionado por futebol, Pharisien decidiu vir ao Brasil para trabalhar nas obras do Mundial.

"Futebol é minha grande paixão. Quero ajudar a construir o estádio e, em 2014, assistir aos jogos do Brasil lá."

Como Tabatinga não absorve a mão de obra dos mais de 1.400 haitianos que estão atualmente na cidade, eles passam o dia fazendo planos. É o caso de Jeff Emisial, 28, que tinha uma empresa de equipamentos metálicos em Porto Príncipe, capital do país.

Com o terremoto de 2010 -que devastou o Haiti-, o negócio foi completamente destruído e transformou-se num prejuízo de mais de R$ 35 mil. "Quando saí do Haiti, só pensava em chegar a São Paulo para recuperar o dinheiro", diz. Mas o caminho até a capital paulista não é simples.

Ontem, a Folha acompanhou um grupo de 30 haitianos que viajou durante a madrugada de Rio Branco a Porto Velho. Nos últimos dias, eles vêm aproveitando a passagem de ônibus paga pelo governo acriano até Rondônia para iniciar o percurso rumo à capital paulista.

Entre si, os oito haitianos que estavam no ônibus em que a Folha embarcou sorriam e faziam brincadeiras, conversando em creole, a língua mais usada no Haiti. Sentados no fundo do ônibus e com domínio precário do português, mantinham pouco contato com os brasileiros.

Dos 30 que viajaram, ao menos cinco estavam decididos a seguir de alguma forma até São Paulo. "Rondônia não está tão bom, em São Paulo tem muito mais trabalho", afirmou o pedreiro Désir Mondelus, 44.

Logo depois de desembarcar, já começou a fazer planos com um primo para seguir viagem. Ao saber que o trajeto de ônibus custa em torno de R$ 400, lamentou. "Não temos dinheiro."

Agora, ele terá de encontrar alternativas para chegar à capital paulista, onde quer viver com a mulher e os três filhos, que atualmente estão em Porto Príncipe.

É semelhante a situação dos haitianos que chegam a Manaus. Na capital, muitos têm dificuldade em conseguir um emprego. Comprar as passagens para São Paulo se torna um desafio.

"Primeiro, eu preciso de trabalho, seja em Manaus ou em outra grande cidade. Mas, depois, pretendo ir a São Paulo", conta Lordius Exenord, 36, que deixou a mulher e a filha de dez anos no Haiti.

Professor de francês e matemática, ele acredita que o Brasil é o melhor país para se imigrar no momento. "A economia brasileira está muito forte".

Atualmente, dos 4.000 haitianos que já entraram pelas fronteiras brasileiras, 26 estão hospedados na Casa do Migrante, em São Paulo.

Segundo a instituição, porém, conseguir trabalho não é uma tarefa simples. Os que conseguem costumam atuar no mercado informal, principalmente nas áreas de construção civil e limpeza.

Há três meses na Casa do Migrante, o haitiano Jean Garbin Marcellin, 31, ainda não conseguiu um emprego. Mas ele está confiante. Dentro de alguns dias sai o resultado dos testes que fez para trabalhar na construção do novo estádio do Corinthians.

"Estou ansioso pelo resultado. Para mim é um sonho ajudar a erguer o estádio da Copa". Se aprovado, Jean começa a trabalhar no próximo dia 20.

Nem todos chegam a fazer entrevistas de emprego. Mesmo após um mês em São Paulo, Reginald Darcelin, 30, ainda ensaia as primeiras palavras em português.

Para procurar trabalho, só se for acompanhado de amigos. "Eles me ajudam a traduzir toda a conversa. Mas ninguém quer contratar alguém que não fala português, né?".

"Só não saio de São Paulo porque tenho dinheiro de quando trabalhei em Manaus", diz Magarette Pierre, 26. Desempregada há dois meses, não se arrepende de ter vindo. "Aqui ainda é melhor do que no Haiti."

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