Prisão de humorista gera debate sobre liberdade na França
A detenção de um humorista francês por fazer uma piada aparentemente simpática com os extremistas que massacraram 12 pessoas no jornal francês "Charlie Hebdo" gerou queixas de que as leis de proteção à liberdade de expressão na França operam com dois pesos e duas medidas.
Dieudonné M'Bala M'Bala, que já havia sido condenado por antissemitismo, foi detido nesta quarta (14), solto em seguida e informado de que será julgado em fevereiro por apologia ao terrorismo. Em sua página no Facebook, ele escreveu "Eu sou Charlie Coulibaly".
A frase é uma brincadeira com o slogan de apoio às vítimas do "Charlie Hebdo" --"Je Suis Charlie" (Eu Sou Charlie, em francês)-- combinada ao sobrenome de Amedy Coulibaly, que matou quatro pessoas em um mercado judaico no dia 9.
Bernard Cazeneuve, ministro do Interior, disse que o comentário demonstrava "irresponsabilidade, desrespeito e uma propensão a alimentar o ódio e a divisão, e isso é insuportável".
Dieudonné, que tem grande número de seguidores na França, respondeu: "Só estava tentando fazer as pessoas rirem, e rirem diante da morte, porque a morte ri de nós, como o 'Charlie' lamentavelmente sabe".
A nova polêmica envolvendo Dieudonné revelou um sistema no qual uma longa tradição de liberdade de expressão convive com barreiras legais adotadas contra o discurso do ódio.
"Por que a liberdade de expressão para em Dieudonné?", perguntou o escritor e blogueiro Nicolas Bourgoin.
De acordo com advogados, parte da resposta é que os comentários de Dieudonné foram entendidos pelos promotores franceses como defesa ou apoio explícito ao terrorismo, e há severas leis contra isso na França.
A questão mais complicada é o grupo de leis de combate à discriminação. A liberdade de expressão pode ser cerceada se um tribunal determinar que pessoas são perseguidas pela religião, raça ou orientação sexual.
O próprio "Charlie" enfrentou problemas judiciais por isso. Em 2007, a Grande Mesquita de Paris e a União de Organizações Islâmicas Francesas acusaram o jornal de racismo por cartuns que retratavam Maomé. O processo foi arquivado.
Em contraste, juízes repetidamente definiram como ilegais as controversas piadas de Dieudonné. A última condenação foi em 2013, por antissemitismo, após ter dado a entender que o lugar de um jornalista judeu era a câmara de gás.