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Clóvis Rossi

Nem abanar o rabo nem latir

O Brasil amadureceu o suficiente para não precisar afirmar-se sendo contra ou a favor dos EUA

Durante boa parte do último meio século, as relações Brasil/Estados Unidos se desenvolveram à sombra da célebre frase do general Juracy Magalhães, chanceler da ditadura, segundo a qual "o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil".

Para os opositores do regime militar, valia o contrário sempre, mesmo quando alguma coisa boa para os EUA poderia ser boa também para o Brasil. Para os americanófilos, a frase do general tinha a força da palavra de Deus.

Por isso, as trocas de visitas entre os governantes dos dois países estavam geralmente cercadas de emoção ou pelo menos de torcida. De um lado, para que o presidente brasileiro de turno abanasse o rabinho para o "grande irmão do Norte". De outro, para que desafiasse o "império".

Talvez por esse histórico, surpreende, em especial aos jornalistas que vivemos de emoções fortes, o fato de que a visita de Dilma Rousseff aos Estados Unidos, a partir de hoje, tenha baixo teor delas.

Mas a expectativa morna apenas revela que o Brasil cresceu, amadureceu e arquivou a frase de Juracy tanto para aplaudi-la quanto para contestá-la. O Brasil-2012 não precisa mais nem agradar aos Estados Unidos nem confrontá-lo para se afirmar na cena internacional.

É um fato que finca raízes antes de 2012, a bem da verdade. O Brasil virou um país normal, digamos assim, depois que se redemocratizou e depois que estabilizou a economia. Uma coisa é receber a visita de um Jimmy Carter, em 1978, empenhado em discutir direitos humanos até com opositores do regime, como o cardeal Paulo Evaristo Arns. Outra coisa é discutir direitos humanos na Síria, em Cuba ou em Guantánamo como eventualmente ocorrerá na viagem de Dilma.

Uma coisa é ouvir sermões repetidos sobre uma inflação que chegou a 80% ao mês. Outra é discutir o que o ministro Mantega chama de guerra cambial ou a crise global, no âmbito do G20, de que ambos os países fazem parte.

Ao mudar o Brasil, mudou a percepção do mundo sobre ele, do que dá prova o relatório da força-tarefa criada pelo Council on Foreign Relations para estudar as relações Brasil/EUA, dirigida por Julia Sweig, especialista em Brasil (e Cuba) e logo mais colega neste espaço, para bem dos leitores da Folha.

Diz o texto: "A mensagem desse relatório dificilmente poderia ser mais clara: o Brasil é importante não só regionalmente, mas globalmente. Suas decisões e ações irão afetar o futuro da economia, do meio ambiente e da energia mundiais, bem como o futuro da diplomacia e da estabilidade global. O Brasil é um dos países seletos que mais irão influenciar o século 21. As políticas externas de Brasil e Estados Unidos devem se ajustar de acordo".

Para ser franco, acho que há algum exagero nessa louvação, mas não muito. O fato é que, quando uma instituição do prestígio do CFR diz que as políticas dos dois países "devem se ajustar", está enterrando de vez a ideia infantil de que o que é bom para os EUA é bom (ou ruim) para o Brasil. "Ajustes" podem não ser emocionantes, mas valem mais que submissão ou confronto.

crossi@uol.com.br

AMANHÃ EM 'MUNDO'
Luiz Carlos Bresser-Pereira

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