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José Viñals

Países ricos estão despreparados para crise

Diretor do FMI diz que nova turbulência seria mais aguda, dado o atual nível de desemprego, superior ao de 2008

Para o espanhol José Viñals, com o aumento muito rápido do crédito, governo brasileiro deve se manter vigilante

LUCIANA COELHO
DE WASHINGTON

O Brasil deve se acostumar a um real mais valorizado e se preparar para absorver um volume maior de investimentos externos, afirma José Viñals, o número um do Fundo Monetário Internacional para mercados e finanças.

Viñals, que dirige o Departamento de Mercados Monetários e de Capitais do FMI, recebeu a Folha para uma entrevista em que ressaltou a necessidade da barreira anticrise -o "firewall".

Em caso de novas turbulências, alerta, o sistema financeiro pode estar melhor, mas os governos, dado o dinheiro já gasto e o desemprego muito mais alto do que em 2008, terão uma margem de manobra muito menor. A seguir, trechos da entrevista:

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Folha - O FMI parece indicar que os fluxos de capital hoje estão em um nível ok, mas as políticas econômicas na Europa e nos EUA, não. Qual seria o equilíbrio aí?
José Viñals - Como os riscos estão hoje mais nas economias avançadas, são elas que devem fazer o ajuste. Isso ajudará, no decorrer do tempo, na normalização das políticas monetárias e também na do fluxo de capitais. Para que a confiança retorne aos mercados europeus, é preciso implementar, no nível nacional, políticas já decididas. No nível europeu, o "firewall" já está posto. É necessário agora que as autoridades europeias tracem uma rota clara para maior integração financeira e fiscal, pois os mercados querem sinais de que elas querem avançar no processo de integração.

Isso leva tempo.
Leva, talvez anos. Algumas dessas coisas são objetivos de médio prazo, como um arcabouço para regulamentação e supervisão financeira realmente pan-europeu. Mas o importante é o compromisso de avançar nessa direção.

O FMI cita também o risco de fuga de recursos dos emergentes. Como se prevenir?
No caso do Brasil, se houver necessidade de moeda doméstica ou moeda estrangeira para que se mantenham as atividades econômicas normais, acho que as autoridades devem fornecer a liquidez necessária.

E no caso de uma nova entrada maciça de recursos? Como o sr. vê as medidas do governo, reduzindo juros e aumentado o IOF?
As medidas fazem sentido, dada a seriedade do desafio que a entrada de capital impôs ao Brasil. É importante discernir entre coisas de curto prazo e coisas que qualquer mercado emergente com perspectivas de crescimento excelentes como o Brasil precisam fazer.
Países como China e Brasil serão foco de interesse dos investidores internacionais. Precisam estar preparados para absorver um nível estrutural maior de fluxos de capital do que antes. E isso precisa ser admitido pelas autoridades, para que o sistema econômico e financeiro absorva bem esses níveis.

Agir na política fiscal?
Não, mas se um país tem um crescimento mais acelerado que os demais, atrairá, estruturalmente, níveis mais altos de capitais. Isso vai se refletir no câmbio nominal e no câmbio real, e deve-se permitir que esse movimento aconteça com o tempo. É diferente de tentar evitar volatilidade excessiva.

Em outras palavras, acostumar-se a um real mais forte?
Há uma tendência natural para que as economias que crescem mais rápido tenham uma apreciação da taxa de câmbio nominal e real. A única coisa que dá para decidir é como essa apreciação ocorrerá -achamos melhor pela taxa de câmbio nominal do que por pressões inflacionárias.

O risco de superaquecimento parece por ora domado, mas o fundo aponta riscos no mercado imobiliário.
O crédito no Brasil aumentou muito rápido. É importante se manter vigilante para poder lidar com as implicações na estabilidade financeira que isso pode ter, pois nós sabemos que as taxas mais altas de crédito hoje são normalmente associadas a maior inadimplência. As autoridades precisam manter isso sob escrutínio.

O sr. ressalta a necessidade de reforma do sistema financeiro global. O que falta?
Nos últimos anos, foi feito um grande trabalho na frente regulatória. Há ainda duas coisas essenciais: completar a agenda de políticas e implementá-las. É preciso finalizar a reforma do mercado de derivativos e [resolver] o tratamento das chamadas instituições sistemicamente importantes - "grandes demais para falhar".

Caso o cenário piore, estamos mais preparados?
Os bancos melhoraram sua posição de capital, então estariam mais preparados do que há três anos. Por outro lado, agora começaríamos, ao menos nas economias avançadas, com desemprego maior e com margem de manobra bem mais restrita.

Para a barreira anticrise, US$ 400 bilhões bastam?
Isso está em debate. As circunstâncias parecem um pouco melhores, talvez levem a repensarmos o valor. Mas não vamos nos enganar -a quantidade necessária ainda é grande, porque os riscos permanecem altos.

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