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Entrevista Kenneth Rogoff

Alto crescimento chinês vai acabar dentro de seis anos

Saída da Grécia da zona do euro levará caos à Europa, e França e Alemanha poderiam se tornar um só país, diz ex-economista do FMI

VERENA FORNETTI
DE NOVA YORK

O economista Kenneth Rogoff, professor de Harvard e uma das vozes mais respeitadas quando se trata de crise, faz previsões sombrias: a bonança chinesa deve acabar em seis anos e a eventual saída da Grécia da zona do euro vai levar o caos à Europa.

Também tem proposições inusitadas: para ele, França e Alemanha poderiam se tornar regiões de um só país.

Rogoff é autor do livro "Oito Séculos de Delírios Financeiros", escrito com Carmen Reinhart, em que os dois economistas analisam as crises na história e concluem que elas provocam quase dez anos de desemprego elevado. Leia trechos da entrevista.

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Folha - A Grécia tem solução? O sr. vê alternativa ao calote?

Kenneth Rogoff - Será muito difícil a Grécia permanecer na zona do euro. Ela já está dando calote; a questão hoje é quão maior será e quão caótica a situação ficará.

Qual seria o impacto de uma eventual saída da Grécia da zona do euro? Isso poderia ser feito de forma ordenada?

Vai ser muito caótico se a Grécia sair. Imediatamente depois, o mercado vai desafiar outros países e a Europa será forçada a tomar medidas muito drásticas -ou o sistema bancário entrará em pânico e a crise financeira rapidamente explodirá o euro.

Claro que a Europa vai responder, talvez com emissão de eurobônus ou grande controle de capitais -e, definitivamente, imprimindo enorme quantidade de moeda.

Sem uma visão clara de união política num prazo razoavelmente curto, 15-20 anos, o euro não sobreviverá. Não pode sobreviver, porque o fracasso em estabelecer a união política limita o que o governo alemão e o BCE podem fazer para salvar todos.

Claro, não augura nada de bom que na recente eleição francesa os eleitores tenham vetado mesmo o fraco pacto fiscal de Merkel e Sarkozy.

Quais são as possíveis soluções para a crise da dívida?

Ou veremos a integração política na Europa para além de qualquer nível imaginado, com França e Alemanha tornando-se regiões de um mesmo país, ou a zona do euro fracassa -exceto talvez um pequeno grupo de euro forte liderado pela Alemanha, com Áustria, Holanda, Bélgica e Luxemburgo.

Não há meio-termo, embora, claro, seja possível que Alemanha e França não levem todos os países da eurozona a essa união mais forte.

União política e fiscal não ocorre do dia para a noite, mas a Europa teria de rumar decisivamente para isso, dando aos mercados confiança de que haverá apoio ilimitado aos Estados com permissão para ficar na eurozona.

Moeda única com governos completamente distintos e soberanos nunca foi boa ideia. Na melhor hipótese, um breve passo temporário no rumo da união política.

O crescimento lento já foi visto como remédio amargo, mas eficaz para conter a crise da dívida. Essa solução ainda é viável? O exemplo da eleição francesa pode descartá-la?

Para os países da periferia, há muito pouca escolha. Emprestaram muito dinheiro, e agora os recursos secaram. O Banco Central Europeu ainda está emprestando por baixo da mesa, e o financiamento do FMI tem estimulado temporariamente a demanda.

Mas, no longo prazo, países periféricos simplesmente terão de se ajustar. E a França, apesar das vociferações do novo presidente, tem pouca capacidade para expandir um governo que já é o maior da Europa. Acredito, porém, que o BCE vai fazer mais.

O sr. disse que a maioria dos emergentes que crescem rapidamente terá uma crise antes de ter a chance de se formar. Pode explicar essa ideia?

Minha preocupação especial é a China; justamente por estar sendo tão bem-sucedida, os mercados esqueceram os riscos inerentes à gestão de uma economia emergente com crescimento tão rápido.

É muito difícil fazer a transição de uma economia pobre para uma de classe média. É verdade que EUA e Reino Unido tiveram muitas décadas de boom, mas mesmo eles experimentaram crises financeiras no caminho.

A ideia popular de que a China está acima de tudo isso, que nunca verá um retrocesso, é bobagem. Há muitas mudanças sociais, políticas e econômicas ocorrendo. Os líderes chineses têm feito um trabalho admirável negociando os desafios até agora, mas eu duvido que eles vão ter tanta sorte para sempre.

As dinâmicas de um colapso financeiro não são difíceis de imaginar. A China investe quase metade da sua receita. Muitos projetos de investimento são baseados em contínuo crescimento hiper-rápido, com pouca margem de erro se ele se abrandar.

Quais são as perspectivas para o crescimento chinês?

É muito provável que, nos próximos cinco ou seis anos, veremos pelo menos um ano em que o crescimento da China será inferior a 5%. Na verdade, daqui a cinco ou seis anos, é muito mais provável que a taxa esteja na faixa de 6% do que na de 9% a 10%.

Como a China pode fazer a transição?

Muito difícil fazê-la sem um declínio acentuado no crescimento. O problema fundamental será manter o dinamismo e a competitividade quando a China buscar mais crescimento doméstico.

Nem mesmo os países asiáticos tiveram êxito nessa transição. Todos continuam a ser muito dependentes das exportações. Têm medo de que uma economia mais voltada para o mercado doméstico diminua o crescimento, e provavelmente têm razão.

Quais são os passos para desenvolver o mercado interno?

Não há solução rápida, mas o mais importante são leis antitruste, reforma política e as coisas que protegem o livre mercado. Os líderes chineses sabem da necessidade de reforma, mas isso será difícil sem reforma política.

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