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Em Madri, revolta dá lugar a resignação

Capital espanhola expõe retrato desolador da situação do país, com um em cada quatro trabalhadores desempregado

Boom imobiliário do país, estimulado pelo crédito barato, fez os empréstimos duvidosos inundarem os bancos

GILES TREMLETT
DO "GUARDIAN", EM MADRI

A mulher por trás da caixa registradora e a freguesa da padaria Valpán, em Madri, conversavam sobre a vida difícil em um país que, na iminência do resgate aos seus bancos, tinha se tornado a bola da vez na interminável crise da dívida europeia.

"Este é o único dia da semana em que eu tenho folga", disse a freguesa, uma garçonete. "Uma amiga conseguiu o mesmo tipo de emprego, mas só no verão, seis dias por semana e em turnos de oito horas que viram nove, sem direito a hora extra".

"Mas ela não reclama. Afinal, conseguiu um trabalho", acrescentou a garçonete. "É igual aqui. Eles cortaram salários", respondeu um funcionário da padaria. "Passou da hora de reagirem a isso."

Mas, enquanto os ministros de Finanças da eurozona debatiam as condições a impor para que a Espanha receba € 100 bilhões para salvar seus bancos, o futuro dos espanhóis no curto prazo parecia ainda mais desolador.

A austeridade já atinge duramente um país antes conhecido por estar entre os maiores entusiastas da união do continente. O desemprego, que hoje afeta um a cada quatro trabalhadores espanhóis, deve se manter nesse patamar até o próximo ano.

Na capital da Espanha, predominantemente conservadora, o clima é mais de resignação que de revolta. Perto da padaria, um adolescente que trabalha no mercado de frutas dá seu veredicto:

"Não entendo bem o que aconteceu, mas acho que algumas pessoas estavam vivendo como reis -e todos os outros, nós, como idiotas".

Não deve haver tão cedo em Madri protestos à moda de Atenas; fotógrafos à procura de imagens dramáticas estão indo para Barcelona, onde esquerdistas radicais acusam a polícia de perseguição e os policiais dizem que prendem apenas os responsáveis por atos de violência.

O resgate expõe completamente as raízes do problema do setor bancário espanhol: uma década de boom imobiliário, fomentado por dinheiro barato (com juro baixo, graças à Alemanha), inundou os bancos de créditos podres.

Os espanhóis continuam pagando hipotecas e recorrendo à família quando não conseguem quitar contas. Quem cavou o buraco foram imobiliárias e especuladores de terras, junto com os altos funcionários dos bancos que concederam os empréstimos.

Há quem acredite, porém, que a população às vezes gastou irresponsavelmente na era do crédito fácil. "Todo o país extrapolou -sindicatos, executivos, banqueiros e políticos. O que precisamos agora é voltar ao trabalho", diz Juan Roig, dono da rede de supermercados Mercadona.

Tradução de ROGÉRIO ORTEGA

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