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Esvaziado, Itamaraty passa por teste de fogo

Crise no Mercosul é primeiro grande desafio regional do ministro Patriota, que enfrenta falta de sincronia com Dilma

Fontes em Washington, Brasília e Genebra veem redução da estatura do Brasil em debates e da projeção global do país

Juan Mabromata/France Presse
Patriota e Dilma na cúpula do Mercosul em Mendoza, em junho
Patriota e Dilma na cúpula do Mercosul em Mendoza, em junho

LUCIANA COELHO
DE WASHINGTON
NATUZA NERY
DE BRASÍLIA

A crise no Mercosul, com a sucessão no Paraguai e a entrada da Venezuela no bloco, lançou a diplomacia brasileira e o chanceler Antonio Patriota em seu primeiro grande teste como líder regional.

O desafio será a falta de sincronia entre o Itamaraty e a presidente Dilma Rousseff. Observadores privilegiados da "corte" em Brasília, Washington e Genebra ouvidos pela Folha e que pediram reserva do nome diagnosticam: a Chancelaria não se adequou ao estilo da presidente.

Desde que ela assumiu, ocorre um esvaziamento da posição brasileira em fóruns internacionais e em debates sobre temas relevantes, frustrando ambas as partes.

Uma autoridade graduada de uma organização internacional avalia que houve um momento em que a política externa brasileira, no governo Lula e no governo FHC, "era melhor do que o país". Hoje, entretanto, o país é melhor que a política externa, o que faz o Brasil jogar numa "liga inferior à sua".

Dilma gosta de deixar claro que ela e os diplomatas não falam a mesma língua (neste ano, ela faltou ao almoço dos formandos do Instituto Rio Branco e evitou a foto com eles). A relação com Patriota reflete isso.

Ao assumir, a presidente mostrou que queria uma "diplomacia de resultados". Os diplomatas são sua antítese na mesa de negociação: enquanto ela é dura, eles sempre buscam o consenso.

Patriota está fazendo -segundo um diplomata familiarizado com a dinâmica entre os dois- o que ele acha que a presidente quer que ele faça, o que "está errado".

O chanceler não é o único a levar broncas públicas de Dilma, mas seu estilo reservado fez dele alvo recorrente.

Quando o Brasil emitiu nota sobre os ataques na Líbia, por exemplo, interlocutores contam que Dilma ficou furiosa e exigiu que todos os posicionamentos do Itamaraty lhe fossem submetidos.

Em visita aos EUA, em abril, Dilma desmarcou a entrevista de Patriota com jornalistas americanos. O episódio ilustra sua política externa: a visita ficou quase imperceptível na imprensa local.

CENTRALIZAÇÃO

Como em outras áreas, a presidente concentrou em si as decisões. Mas, fora do país, são crescentes as críticas de que Dilma tem pouco apreço por temas externos e isso começa a reduzir a projeção do Brasil. Por outro lado, nenhum de seus movimentos foi considerado desastroso, e o peso econômico do país garante alguma voz a Brasília.

"Já sabíamos que ia encolher, mas encolheu demais", diz um diplomata. Para outro, o país começa a voltar, politicamente, à "periferia".

Nas entrevistas para esta reportagem, as frentes diplomáticas que emergiram pouco têm de política externa.

É o caso da "guerra cambial", bandeira emprestada da economia e usada em fóruns mundiais, e do programa Ciência Sem Fronteira, que Dilma pôs no topo de sua agenda na visita aos EUA, mas que ainda engatinha.

A outra frente é negativa: a rusga com a Organização dos Estados Americanos após esta pedir a suspensão da construção da usina de Belo Monte, que culminou na retirada do embaixador brasileiro da OEA, Ruy Casaes.

De acordo com uma pessoa envolvida no episódio, a presidente tinha razão em reclamar, mas a reação foi considerada exagerada e atraiu mais atenção para o tema.

Recentemente, Dilma avaliou positivamente o resultado da Rio +20. O timing escolhido, porém, contribuiu para a ausência de nomes de peso como Barack Obama, David Cameron e Angela Merkel, mais preocupados com agendas domésticas ou a crise.

A predileção da presidente pela agenda econômica acabou deixando o protagonismo na política externa com o Planalto, com o assessor Marco Aurélio Garcia reemergindo, e com a Fazenda.

Hoje, é a equipe do ministro da Fazenda, Guido Mantega, quando não ela mesma, que escreve os pontos de negociação da presidente, com os diplomatas informados tardiamente das decisões.

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