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Ilustrada em cima da hora

"Não vejo graça em mentir", diz escritor catalão em SP

Enrique Vila-Matas afirma que suas histórias podem parecer irreais, mas que nada é inventado por acaso

DE SÃO PAULO

O movimento dos indignados na Espanha tem a ver com a sociedade do espetáculo. Ao futebol do Barcelona faltava a imperfeição. Saber que o fracasso existe e pode ser elegante é solução para tudo.

Na Sabatina Folha, realizada ontem no auditório do MAM, em São Paulo, o escritor catalão Enrique Vila-Matas, 64, um dos principais nomes da literatura contemporânea, falou sobre o momento atual de seu país e sobre temas recorrentes em sua obra, como fracasso, suicídio, melancolia, desaparecimento, e o que estiver associado ao que chama de "território da negatividade".

"Franz Kafka dizia que o positivo nos é dado na vida, e que nos cabe investigar o negativo", disse o espanhol.

Autor de 28 livros, traduzido em 32 países e vencedor de prêmios literários na Europa, Vila-Matas veio ao Brasil como convidado da Flip, encerrada no domingo.

Participaram como entrevistadores da sabatina os jornalistas Paulo Werneck, editor da "Ilustríssima", Manuel da Costa Pinto, colunista da Folha, e Rodrigo Levino, editor-assistente da "Ilustrada".

Sem fugir a uma das principais características de seus livros -menções frequentes a autores clássicos da literatura-, Vila-Matas citou Primo Levi, Elias Canetti, Scott Fitzgerald, além de Kafka.

"Suicídios Exemplares", "O Mal de Montano", "Bartleby e Companhia" e "Paris Não Tem Fim" -publicados pela editora Cosac Naify- são alguns de seus títulos.
"Ar de Dylan", seu último livro, foi concebido durante um passeio pela avenida Paulista, há um ano e meio, de acordo com o escritor, que diz agora pesquisar a origem da palavra "Higienópolis".

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Melancolia
Existem dois modos de ver o mundo. Um é: o mundo é assim e não se pergunte a respeito. O outro, de que estamos em um planeta equivocado, não nos adaptamos e somos melancólicos buscando algo que perdemos. As duas maneiras são válidas, mas, para mim, interessa mais não só contar a história, mas construí-la de forma diferente. É preciso interpretar, investigar.

Ar de Dylan
O ponto de partida é a história de um jovem que quer fracassar em um congresso sobre fracasso. Seu pai era um escritor de sucesso, que usava heterônimos. O filho deseja não triunfar como o pai, ser ele mesmo, em contraponto às várias personalidades do pai.

Brasil
Agora estou pesquisando a origem da palavra Higienópolis, que dá nome ao bairro. Me disseram se tratar de invenção. Nada é inventado por acaso. Minha maneira de contar histórias pode parecer irreal, mas nunca é mentira. Não vejo graça em mentir.

O poder da palavra
Na vida atual, os intelectuais, os escritores e as pessoas que pensam estão resignadas a uma percepção de que o mundo é um desastre. E de que não se pode fazer nada além de seguir escrevendo, pensando. Acredito que as palavras têm o poder de mudar o mundo.

Indignados
Bem em frente à minha casa, os manifestantes se reuniam. Reparei que a polícia chegava uma hora antes, e a TV, em meia hora. Aos que protestavam, pobrezinhos, cabia o show. Esta é a sociedade do espetáculo.

Processo de criação
Às vezes, escrevo cem páginas sem ter encontrado um ponto de vista e um tom, que são as duas coisas essenciais. A ideia nasce no meio do livro. Daí é preciso reinventar. Há dias em que tudo sai bem e você até desconfia. E outros em que você vai dormir mal-humorado, achando imprestável o que escreveu. No dia seguinte, você acorda, depara com seu texto e descobre um caminho.

Barcelona Futebol Clube
O problema do Barcelona sob o comando do [Pepe] Guardiola é que era um time perfeito. Escrevi um artigo a respeito, mencionando a famosa ideia de Tolstói de que as famílias felizes são iguais, e as infelizes, interessantes. Queria criticar algo no Barça e não havia o que criticar.

Aos jovens escritores
Uns dizem para ler muito. Mas eu digo: não leia. Isso é bom e ruim. Quando comecei a escrever, lia pouco, só poemas. Assim, criei um estilo original pela falta de conhecimento dos modelos que haviam. Mas não ler também é perigoso.

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