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Clóvis Rossi

A Síria e o fracasso do mundo

Um arcaico sistema de governança global assiste impotente à destruição de um país

A destruição da Síria é um caso emblemático de fracasso do mundo ou ao menos da governança global.

O Conselho de Segurança, coração do sistema ONU, ficou paralisado por uma disputa entre potências, com interesses que pouco ou nada têm a ver com o interesse primordial dos sírios, que era e continua sendo sobreviver.

Não sobreviveram 19.687 pessoas, das quais 1.522 crianças, entre o início da revolta contra a ditadura Bashar Assad, em março de 2011, e o último dia 15. Há entre 112 mil e 250 mil refugiados nos países vizinhos, quantidade que aumenta exponencialmente a cada dia.

Há 200 mil pessoas, pelo menos, deslocadas de suas casas. Há 3 milhões de sírios que precisam de ajuda humanitária para sobreviver. Tudo isso em um país de apenas 21 milhões de habitantes.

Pior: não há o mais leve indício de que se esteja perto de algum alívio para a tragédia, até porque "os acontecimentos em Damasco e Nova York tornam claro que o desenlace da guerra civil síria será decidido no campo de batalha, em vez de no Conselho de Segurança", como escreve Richard Gowan, diretor-associado do Centro para a Cooperação Internacional da Universidade de Nova York.

O veto permanente da Rússia às propostas ocidentais de apertar mais ainda as sanções contra a ditadura Assad tiraram do Conselho de Segurança qualquer chance de influenciar na crise.

Está falido o modelo que dá direito de veto aos cinco países vencedores de uma guerra que terminou já faz quase 70 anos.

Aliás, chega a ser irônico que o suporte inoxidável da Rússia ao ditador acabe sendo inútil, como afirma Gowan: "A Rússia pode continuar a vetar as resoluções do Conselho de Segurança pelo tempo que quiser, mas, enquanto consegue levar ao impasse a batalha diplomática em Nova York, ela está perdendo a verdadeira guerra, na Síria".

Quem está ganhando, com a ascensão dos rebeldes, são Arábia Saudita e Qatar, que armam o chamado Exército Sírio Livre, e a Turquia, que lhes oferece um santuário. A Arábia Saudita é uma ditadura não muito diferente da que está ajudando a depor na Síria, embora de signo religioso diferente.

Ante a impotência da comunidade internacional, a única que seria capaz de exercer um poder moderador, o pós-Assad será tremendamente complexo, mais complexo quanto mais demorar.

Complexidade assim resumida pela revista "The Economist": "A Síria após Assad será um perigo para seu próprio povo e seus vizinhos. Um banho de sangue sectário é um risco, armas químicas sem controle são outro, ondas de refugiados um terceiro. A Síria poderia se tornar o foco de rivalidade entre Irã, Turquia e o mundo árabe. A violência poderia sugar Israel ou espalhar-se pelo Líbano".

Enfim, há uma boa possibilidade de que ocorra tudo ou quase tudo que os opositores a uma intervenção externa na Síria esgrimiam como argumento para descartá-la.

O impasse entre as potências e a omissão de muitos (Brasil inclusive) acabaram produzindo um cenário assustador e não evitaram mais uma catástrofe humanitária.

crossi@uol.com.br

AMANHÃ EM MUNDO
Rubens Ricupero

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