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'Mercosul não tem como moderar Chávez'

Para pesquisador do chavismo, bloco não tem instrumentos para deter os danos à separação de Poderes na Venezuela

Autor de "Dragão nos Trópicos" prevê que resultado apertado na eleição presidencial provocará uma crise

FLÁVIA MARREIRO
DE SÃO PAULO

A duas semanas das eleições presidenciais na Venezuela, que podem dar a Hugo Chávez mais seis anos de poder -chegando a 20 de cargo em 2019-, o cientista político americano Javier Corrales, 46, diz que o país pode se transformar num problema democrático para o Mercosul.

O bloco, diz o professor do Amherst College, em Massachusetts, não tem instrumentos para deter o que ele classifica de deterioração da separação de Poderes na Venezuela, um "regime híbrido" que opera para desmantelar pesos e contrapesos à prevalência do Executivo.

Corrales resumiu 14 anos de relações institucionais, política social e boom petroleiro do chavismo em "Dragon in the Tropics" [dragão nos trópicos], escrito em parceria com o economista venezuelano Michael Penfold e lançado pela editora do prestigioso Instituto Brookings no ano passado.

Na entrevista abaixo, ele diz que "fatores exógenos" estão afetando as díspares pesquisas eleitorais na Venezuela e que o país pode assistir a uma crise caso a diferença de votos entre o presidente e o oponente Henrique Capriles seja muito pequena.

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Folha - O seu livro argumenta que Chávez é um regime híbrido, um "dragão" que não é do bem nem do mal. Por quê?

Javier Corrales - Muitas vezes, a oposição pensa que Chávez é um ditador. Já os governistas pensam que representam a democracia que nunca antes houve no país.

O que dizemos é que é uma posição intermediária: eles mantêm certas instituições democráticas, mas não são completamente fiéis à lei democrática.

É um sistema que vem destruindo a indústria, há inflação, mas, por outro lado, há o maior boom de consumo da história da Venezuela. É bonança e ruína econômica ao mesmo tempo.

Do momento em que lançamos o livro para cá, tornei-me mais pessimista. Ele vem se tornando mais autoritário. Mas ainda há limites que não cruza: suspender eleições, proibir toda a liberdade de expressão.

O Mercosul tem cláusulas democráticas. Como deve lidar com um "regime híbrido"?

É um gravíssimo problema. Quando se pensou na cláusula democrática, o Mercosul queria salvar as democracias de golpes de Estado, a maior ameaça do momento.

Havia ocorrido o caso de Fujimori, em 1993, mas o mais cotidiano eram golpes ou presidentes que suspendessem a Constituição. Se isso acontecesse, se viesse um golpe de Estado, suspensão da Constituição venezuelana por parte do presidente, o Mercosul teria de atuar.

Mas o que ocorre quando o presidente começa a eliminar os freios e contrapesos? O que prevalece é que os presidentes não querem criticar seus pares. Essa é a grande lição dos anos 2000.

Se a ameaça vem do Poder Executivo, e não chega a ser eliminação total da Constituição, os dispositivos internacionais para defender a democracia institucional não atuam. A defesa da democracia internacional não está adequada ao mundo dos regimes híbridos.

Como vê o cenário eleitoral na Venezuela? O que dizer das pesquisas díspares?

É a eleição mais difícil para o chavismo desde 2004. Além da crise econômica de 2008 e 2009, há uma crise de performance. É a ponte que cai, a refinaria que explode.

Mas não podemos dizer que Chávez está perdendo neste momento. Quanto às pesquisas, o que está acontecendo não é típico. Isso significa que algo exógeno as está afetando. Quem vai saber? É muito difícil prever.

O que digo é: Chávez quase nunca aparece com mais de 50%, e a oposição está crescendo. A pergunta é se ela vai conseguir alcançar o governo.

Se o governo ganhar, mas por dois pontos, será crise na Venezuela. Há grande risco de que a oposição diga "não queremos os resultados". Muitas das chamadas "revoluções das cores" do Leste Europeu surgiram assim. O problema é um cenário como o do México em 2006.

A oposição na Venezuela diz que vai manter os programas sociais, não vai mudar as regras da petroleira PDVSA. Chávez ganhou a batalha ideológica, ao menos na campanha?

A campanha da oposição não se baseia em criticar a política social. Critica o manejo dos recursos públicos e critica os maus-tratos aos opositores. Na Venezuela, nunca ninguém pode ganhar dizendo "vamos deixar de ser populistas". A oposição entendeu. Parece que os venezuelanos pensam: se Deus lhes deu de presente tanto petróleo, para que eles devem ter trabalho de administrá-lo, quando basta gastá-lo?

Leia íntegra da entrevista
folha.com/no1157761

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