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Nas garras de Gaddafi

Jovem que foi escrava sexual do ditador líbio por cinco anos conta a rotina de abusos e violência

DE SÃO PAULO

Aos 15 anos de idade, Safia entregou flores ao ditador líbio Muammar Gaddafi. Ele fazia visita oficial à escola onde ela estudava, em Sirte. O ditador -morto em outubro passado- passou a mão pelos cabelos escuros da garota e tocou-lhe os ombros.
"Foi uma grande honra. Eu o chamava de 'pai Muammar'", contou Safia ao diáriofrancês "Le Monde", que protegeu seu verdadeiro nome.
Mais tarde, ela soube que, com aquele gesto, Gaddafi a recrutou para seu harém.
No dia seguinte, três mulheres em uniforme foram buscá-la no salão de beleza de sua mãe. Disseram-lhes que Gaddafi queria vê-la e "dar-lhe alguns presentes".
"Como suspeitar de algo? Ele era o herói, o príncipe de Sirte", disse Safia ao "Monde". Gaddafi tinha então 62 anos. Ela foi levada até uma caravana no deserto onde estava o ditador.
Segundo ela, outras 20 mulheres -que tinham entre 18 e 19 anos- viviam ali à disposição do ditador. Safia recebeu lenços e roupas sensuais e lhe ensinaram a dançar e a fazer striptease, assim como "outros deveres".

A PRIMEIRA NOITE
Nas três primeiras noites, Safia dançou sozinha para Gaddafi. Ele a observou, mas não a tocou. Até que disse: "Você vai ser minha puta". A caravana rumou para Sirte.
Na noite seguinte, ele a estuprou. Ela lutou. Ele bateu nela, puxou seus cabelos. Safia tentou fugir, mas foi impedida. "Ele continuou nos dias seguintes. Tornei-me sua escrava sexual. Ele me estuprou por cinco anos."
Gaddafi também a obrigava a fumar, a tomar uísque e a usar cocaína. "Para Muammar, [as jovens] eram simples objetos sexuais", diz Safia.
Segundo ela, Gaddafi também mantinha relações sexuais com homens e vivia sob efeito de cocaína.
E organizava festas à moda bunga-bunga com modelos italianas, belgas e africanas, "apreciadas" pelos filhos do coronel e outros homens.

A FUGA E O CASAMENTO
Cansado de vê-la deprimida, Gaddafi autorizou por três vezes que ela fizesse breves visitas à sua família, usando um carro do palácio.
Na quarta saída, em 2009, Safia fugiu com a ajuda de seu pai. Disfarçou-se como idosa e foi para o aeroporto. De lá, voou para a França.
Ela ficou um ano fora do país, antes de retornar para a Líbia, clandestinamente. Em abril de 2011, Safia fugiu para a Tunísia, onde se casou em segredo. Ela tinha esperanças de um dia viver com o marido em Malta ou na Itália.
"Quando vi o cadáver de Gaddafi exposto à multidão, senti um breve prazer. Depois, veio um gosto amargo na boca", relatou ao jornal francês. Safia queria que Gaddafi não tivesse sido morto, mas sim preso e julgado por um tribunal internacional.
"Eu estava me preparando para enfrentá-lo e perguntar, olhos nos olhos: Por que você fez isso comigo? Por que me violentou? Por que me espancou, drogou, xingou? Por que roubou minha vida?"
Belíssima, entre vários acessos de choro, Safia diz ao repórter do "Monde" que se sente "como se tivesse 40 anos." Mas ela tem apenas 22.

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