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Pichando os Castro

Grafiteiro irrita governo cubano com obras críticas em paredes e placas de Havana; detido 4 vezes, teve material confiscado

FLÁVIA MARREIRO DE SÃO PAULO

É praticamente impossível abrir um jornal em Cuba ou caminhar longos períodos em Havana sem topar com uma alusão aos "cinco heróis".

Tudo parte de uma campanha pela liberdade de agentes do país condenados a penas severas na Flórida por espionagem, prioridade máxima para o governo Raúl Castro, que argumenta que eles estavam infiltrados em grupos anticastristas em ações de contraespionagem, e não espionando os EUA.

A insistência no tema foi o ponto de partida para o artista e grafiteiro Danilo Maldonado, 29, cumprir seu objetivo: iniciar o que chama de "diálogo conflitivo" com os dirigentes comunistas.

Com spray na mão, saiu pichando nas paredes e e bancos com a inscrição: "El Sexto", que viraria sua assinatura em todos os trabalhos.

"As pessoas poderiam pensar que era sexto sentido, sexto qualquer coisa. Mas a campanha dos 'cinco' é tão onipresente que não sobra muita interpretação", explicou ele à Folha, numa conversa em Havana no fim de janeiro.

"Heróis somos todos os cubanos, é o trabalhador que ganha salário que não dá para nada", segue ele, que desde já foi detido quatro vezes e teve tintas e agendas de desenho confiscadas.

A polícia chegou a apreender um laptop seu, e ele pichou as ruas pedindo o equipamento de volta. Conseguiu.

A última vez que foi detido brevemente -sem apresentação formal de acusação, uma prática comum na era Raúl- foi durante a visita do então papa Bento 16 a Havana em março passado, ao lado de outros dissidentes.

Do pequeno grupo político e artístico que se opõe ao governo, seus contatos incluem a blogueira Yoani Sánchez e a banda Porno para Ricardo.

As inscrições nos lugares mais visíveis poucas vezes duram mais que um dia. As mais inacessíveis têm mais sorte, conta "El Sexto".

Com graduação não concluída em biblioteconomia, ele diz que a família não entendeu quando ele começou as intervenções."Diziam que eu estava louco."

A primeira intervenção que irritou a polícia foi em 2008, ainda antes de adotar o nome satírico. Num estêncil pôs dois elementos: as letras REV ("de revolução"), e duas flechas apontando para trás, como um "rewind" de gravador.

"A polícia apagou no dia seguinte. A minha ideia era que 'a revolução está retrocedendo'. Mas o que estava lá eram três letras e flechinhas para trás. O resto estava na cabeça deles também."

Maldonado, que se prepara para se tornar pai nos próximos meses, diz que vive de bicos e da venda de trabalhos seus feitos em outras plataformas, como papel.

Conta ter vendido a um comprador inglês, por meio de um amigo no Reino Unido, um trabalho. Trata-se de um grafite representando Fidel e a ordem "Cuspa-o". Não revelou quanto ganhou.

Maldonado, que diz que entre suas referências estão o grafiteiro britânico Bansky e Jean-Michel Basquiat (1960-88), faz outros tipos de intervenção. Em janeiro, quando começou a valer a lei que facilitou viagens ao exterior, confeccionou pequenas asas que colou nos bonequinhos de placas de rua. Batizou de "Todos vão embora." Num dos panfletos que distribui, pede ao receptor preencher: "Medo de...", e indica o lugar para posicionar os polegares e rasgar o papel.

O impacto, diz, não é de entusiasmar. "O que os jovens estão fazendo é fila na porta de embaixadas para imigrar. Conversam comigo dois minutos dizem 'que bom o seu trabalho' e pronto".


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