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entrevista
"Vejo caças de Israel sobre meu bairro"
SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao atender ontem o telefonema da Folha, a palestina Taghreed El-Khodary, correspondente do
"New York Times" em Gaza, pediu que a reportagem retornasse a ligação
alguns minutos depois:
"Está ocorrendo um bombardeio, preciso abrir todas as janelas de meu
apartamento porque os vidros podem explodir se
estiverem fechados quando as bombas caírem".
Com a voz ofegante, ela
descreveu a situação dramática na região, onde Israel tem impedido a entrada de jornalistas.
FOLHA - Qual é a situação
dentro da faixa de Gaza?
TAGHREED EL-KHODARY - A situação é de completo pavor e desespero. As pessoas estão aterrorizadas
por não terem a menor
ideia de quando e onde
cairá a próxima bomba.
Neste exato momento, vejo caças israelenses sobrevoando o meu bairro, tenho medo por não saber
qual é o alvo da vez.
Em um ano e meio no
comando de Gaza, o Hamas teve tempo de se estabelecer em toda parte.
Dias atrás Israel destruiu
na minha rua um prédio
onde havia uma sala do
grupo. Nem eu, que sou
jornalista, sabia da existência deste local.
O problema é que alvos
do Hamas estão em prédios residenciais, mesquitas e depósitos. É impossível atingir esses alvos sem
destruir os arredores.
FOLHA - Como os ataques afetam o dia a dia em Gaza?
KHODARY - As ruas estão
desertas e tudo está fechado, com exceção de algumas farmácias e lojas de
conveniência. É preciso ficar horas na fila para poder comprar pão e remédios, que estão sendo vendidos a preços muito mais
altos do que o normal. E já
está faltando açúcar, arroz
e farinha.
Estive em hospitais onde o cenário é dramático.
Os médicos não sabem o
que fazer com tantos feridos, e vi cenas atrozes de
mães chorando ao lado
dos filhos mutilados.
A situação é agravada
pelos frequentes cortes de
energia elétrica. Às escuras a sensação de pânico fica ainda maior.
FOLHA - A senhora acha que
o número de vítimas é maior
do que o divulgado até agora?
KHODARY - Há 393 mortos
confirmados, entre os
quais 38 crianças e 25 mulheres. O problema é que
ninguém está contando
direito o número de vítimas entre os homens.
Muitas das pessoas que Israel diz serem membros
do Hamas na verdade são
policiais civis da força de
segurança em Gaza ou filiados ao partido que não
têm ligação nenhuma com
a ala militar. Uma coisa eu
garanto: nenhum dos altos
quadros do Hamas morreu nos ataques. Estão todos muito bem escondidos
e protegidos.
FOLHA - O Hamas sai fortalecido ou enfraquecido?
KHODARY - Algumas pessoas responsabilizam o
Hamas pela situação, outras culpam o Fatah por
ter se aliado a Israel e ao
Egito, o que acaba virando
um aval ao bloqueio imposto a Gaza.
Se o Hamas conseguir
resistir a uma ofensiva terrestre ou até mesmo retaliar, então é possível que o
grupo saia fortalecido.
Mas Israel ainda é visto
como o inimigo comum.
Predomina entre os palestinos o sentimento de que
o alvo da ofensiva é o povo
de Gaza, não o Hamas.
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