|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Apesar das crises, África mantém seu "renascimento", diz analista americano
SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL
A violência no Quênia está
afetando o comércio com os
países vizinhos, mas até agora
não há indícios de que as tensões étnicas irão contaminar a
região. A avaliação é do ex-diplomata americano Steven Mc
Donald, especialista em África
no centro de estudos Woodrow
Wilson. Em entrevista à Folha
por telefone, de Washington,
Mc Donald disse que o Ocidente só vê coisas ruins na África e
criticou a falta de interesse das
grandes potências em ajudar o
continente.
FOLHA - A crise queniana é uma crise interna ou a expressão localizada
de um problema regional?
Mc DONALD - A crise queniana
foi desencadeada por uma eleição roubada. Mas a coisa só
chegou às atuais proporções
devido à antiga descrença em
relação às instituições, inclusive a polícia. A população andava muito irritada. Sem falar na
corrupção, falta de serviços etc.
Foi por isso que os protestos
tomaram um viés étnico. É
uma vingança dos kalenjins e
luos sobre os kikuyus pela tomada de suas terras férteis, logo após a independência [em
1963]. É um problema nacional,
mas que pode ter um impacto
regional.
FOLHA - A crise está afetando outros países?
Mc DONALD - Uganda, Ruanda e
Burundi estão em crise de abastecimento de combustível e alguns bens, já que tudo que chega nesses países vem do Quênia. O comércio está perturbado. Mas até agora não há sinais
de que as divisões étnicas irão
se alastrar.
FOLHA - Diante de tantas crises -
Quênia, Darfur,Congo, Somália... -
como o senhor avalia a situação da
África?
Mc DONALD - O "renascimento
africano" continua vivo, apesar
das crises que limitam o seu alcance. Muita coisa boa tem
acontecido na África do Sul, em
Gana, Moçambique, Angola e
até na Nigéria. Houve eleições,
governos mudaram, direitos
humanos passaram a ser respeitados, a lei está prevalecendo. O problema é que nós, ocidentais, sempre vemos a África
como uma entidade única, e
não consideramos as centenas
de diferentes culturas, histórias, economias de lá. Também
não enxergamos lideranças eficientes quando elas existem.
FOLHA - Como avalia a papel das
grandes potências na África?
Mc DONALD - Nas crises da Somália e de Darfur, os americanos não assumiram o papel de
liderança que deveriam. A
ONU, mesmo enfrentando cortes de financiamento e resistência política por parte das
grandes potências, fez um belo
trabalho no Burundi, na República Democrática do Congo,
na Libéria e em Serra Leoa. Em
Darfur, a demora da ONU para
agir foi culpa da falta de compromisso por parte de EUA e
Europa. O papel da China é cada vez maior, mas seu interesse
está muito mais voltado para a
promoção das exportações do
que para o bem da África.
Texto Anterior: Assassinato suspende diálogo no Quênia Próximo Texto: França suspeita de imóveis de luxo de líderes africanos Índice
|