São Paulo, sexta-feira, 01 de fevereiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Apesar das crises, África mantém seu "renascimento", diz analista americano

SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL

A violência no Quênia está afetando o comércio com os países vizinhos, mas até agora não há indícios de que as tensões étnicas irão contaminar a região. A avaliação é do ex-diplomata americano Steven Mc Donald, especialista em África no centro de estudos Woodrow Wilson. Em entrevista à Folha por telefone, de Washington, Mc Donald disse que o Ocidente só vê coisas ruins na África e criticou a falta de interesse das grandes potências em ajudar o continente.

 

FOLHA - A crise queniana é uma crise interna ou a expressão localizada de um problema regional?
Mc DONALD -
A crise queniana foi desencadeada por uma eleição roubada. Mas a coisa só chegou às atuais proporções devido à antiga descrença em relação às instituições, inclusive a polícia. A população andava muito irritada. Sem falar na corrupção, falta de serviços etc. Foi por isso que os protestos tomaram um viés étnico. É uma vingança dos kalenjins e luos sobre os kikuyus pela tomada de suas terras férteis, logo após a independência [em 1963]. É um problema nacional, mas que pode ter um impacto regional.

FOLHA - A crise está afetando outros países?
Mc DONALD -
Uganda, Ruanda e Burundi estão em crise de abastecimento de combustível e alguns bens, já que tudo que chega nesses países vem do Quênia. O comércio está perturbado. Mas até agora não há sinais de que as divisões étnicas irão se alastrar.

FOLHA - Diante de tantas crises - Quênia, Darfur,Congo, Somália... - como o senhor avalia a situação da África?
Mc DONALD -
O "renascimento africano" continua vivo, apesar das crises que limitam o seu alcance. Muita coisa boa tem acontecido na África do Sul, em Gana, Moçambique, Angola e até na Nigéria. Houve eleições, governos mudaram, direitos humanos passaram a ser respeitados, a lei está prevalecendo. O problema é que nós, ocidentais, sempre vemos a África como uma entidade única, e não consideramos as centenas de diferentes culturas, histórias, economias de lá. Também não enxergamos lideranças eficientes quando elas existem.

FOLHA - Como avalia a papel das grandes potências na África?
Mc DONALD -
Nas crises da Somália e de Darfur, os americanos não assumiram o papel de liderança que deveriam. A ONU, mesmo enfrentando cortes de financiamento e resistência política por parte das grandes potências, fez um belo trabalho no Burundi, na República Democrática do Congo, na Libéria e em Serra Leoa. Em Darfur, a demora da ONU para agir foi culpa da falta de compromisso por parte de EUA e Europa. O papel da China é cada vez maior, mas seu interesse está muito mais voltado para a promoção das exportações do que para o bem da África.


Texto Anterior: Assassinato suspende diálogo no Quênia
Próximo Texto: França suspeita de imóveis de luxo de líderes africanos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.