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Ex-reféns e Uribe divergem sobre Farc
Ex-parlamentares libertados pedem que Colômbia aceite exigência do grupo de desmilitarizar municípios para negociar
Ex-senador Eladio Pérez chama de "doente mental" assessor do presidente; Uribe acusa Farc de fazer chantagem com os reféns
FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS
Os quatro ex-parlamentares
recém-liberados pelas Farc
(Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e o governo
do presidente Álvaro Uribe, expuseram, por meio de duras declarações, suas divergências em
torno da exigência da guerrilha
de que sejam desmilitarizados
dois municipíos para negociar a
soltura dos demais 39 reféns
"políticos", entre os quais está a
ex-candidata presidencial Ingrid Betancourt.
Numa emotiva entrevista coletiva anteontem à noite, em
Caracas, os ex-senadores Luis
Eladio Pérez, Orlando Beltrán e
Jorge Eduardo Géchem e a ex-deputada Gloria Polanco exortaram o governo Uribe a buscar
uma "solução política" e a aceitar a exigência das Farc, enfatizando o precário estado de saúde dos seqüestrados, alguns há
mais de dez anos de cativeiro.
"Se o presidente Uribe teme
que a retirada de uma área muito pequena do território colombiano durante muito poucos
dias [45] se converta no epicentro de seqüestros, o que está indicando é que sua política de
segurança democrática não é
tão forte como tem sido vendida aos colombianos", disse Pérez à Folha, após a entrevista.
"Este é o desafio e a isso o
convidamos: que assuma a sua
responsabilidade. Solucionemos. Vamos dar esse passo para salvar a vida de 40 colombianos que estão apodrecendo na
selva colombiana", prosseguiu
Pérez, do Partido Liberal, de
oposição a Uribe.
A pergunta da reportagem
questionava Pérez sobre o argumento do governo Uribe de
que uma zona desmilitarizada
poderia provocar uma onda de
seqüestro semelhante à ocorrida entre os anos 2001 e 2002,
quando o então presidente Andrés Pastrana cedeu 42 mil quilômetros quadrados à guerrilha para as fracassadas negociações de paz. Todos os recém-liberados foram seqüestrados nessa época.
Bate-boca
Durante a coletiva, Pérez fez
ainda duras críticas ao assessor
presidencial de Uribe, José Obdulio Gaviria, que havia chamado os seqüestrados de "doentes
terminais". Chamou-o de
"doente mental" e disse que
preferia falar diretamente
"com o dono do circo, e não os
[com os] seus palhaços".
Já o ex-senador Orlando Beltrán, quase aos gritos, lembrou
a difícil situação dos policiais e
soldados seqüestrados, que formam a maioria dos reféns políticos. "É preciso chamar atenção aos altos comandos militares, dizer-lhes que sejam solidários com seus companheiros
e não qualifiquem como improcedente a desmilitarização de
Pradera e Florida para salvar
algumas vidas."
Com a voz embargada, Polanco também exortou Uribe
aceitar a desmilitarização.
"Meu interesse desde este momento é pedir o acordo humanitário, porque o valor deve ser
dado à vida, e não a um pedaço
de terra, a uns quilômetros."
Os quatro ex-reféns também
agradeceram reiteradas vezes
ao presidente Hugo Chávez e à
senadora da oposição Piedad
Córdoba, a quem atribuem sua
liberação. A mediação dos dois
foi interrompida em novembro
por Uribe, mas os dois mantiveram as gestões.
Chávez e Córdoba x Uribe
Chávez e Cordoba têm sofrido duras críticas do governo colombiano e da maior parte dos
meios de comunicação daquele
país por defenderem que as
Farc devem ser consideradas
como "força beligerante". Durante as grandes marchas realizadas na Colômbia no último
dia 4 de fevereiro, faixas, gritos
e camisetas faziam críticas aos
dois, além de respaldarem Uribe, cuja aprovação está em cerca de 80%, segundo pesquisas.
Questionado pela reportagem sobre o país que vai encontrar na volta à Colômbia, Pérez
elogiou a marcha. Disse que,
"pela primeira vez, a sociedade
começou a despertar para o
drama pavoroso que vivemos e
a necessidade urgente de encerrar o capítulo dos seqüestros como o mais aberrante da
infâmia colombiana".
As declarações dos seqüestrados até agora não provocaram mudanças na posição de
Uribe, que ontem novamente
rejeitou a proposta de desmilitarizar Florida e Pradera. Os
dois municípios estão próximos de Cali, a terceira cidade
do país, e têm uma população
de 110 mil pessoas.
"Chantagem"
Em entrevista coletiva, o presidente colombiano acusou as
Farc de fazer "chantagem" com
a saúde dos seqüestrados.
"Não podemos ocultar toda
nossa preocupação pelo estado
dos seqüestrados doentes, começando pela doutora Ingrid
Betancourt. Com a vida, com a
saúde, não se pode chantagear.
Essas chantagens, que fazia Hitler e agora fazem as Farc, são
inadmissíveis. Por isso, o governo reclama a imediata liberação, incondicional e unilateral, dos seqüestrados em más
condições de saúde."
Mais tarde, em entrevista a
uma rádio local, Uribe disse
que "não tinha uma opinião"
sobre a proposta formulada anteontem por Chávez para criar
um "grupo de países amigos" da
Colômbia semelhante ao criado para solucionar os conflitos
civis na América Central, nos
anos 80 (Grupo de Contadora).
Chávez disse que a proposta,
apresentada ao governo colombiano pelo chanceler francês
Bernard Kouchner na semana
passada, conta com apoio de
países como Brasil, Cuba e Argentina. "Todos estão de acordo, menos Uribe", disse.
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