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Por prestígio, Brasil ajuda países pobres
Governo brasileiro dissemina doações, ações sociais e transferências para nº cada vez mais amplo de parceiros
Objetivo desse "soft power" é conquistar simpatias, influência política e votos em órgãos internacionais
Pedro Sá da Bandeira - 16.out.2008/Efe
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Lula ao lado do presidente de Moçambique, Armando Guebuza, em Maputo; país é um dos recipientes da ajuda brasileira
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
JOHANNA NUBLAT
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Enquanto os Estados Unidos aumentam em mais US$
59 bilhões o orçamento para
as guerras no Iraque e no Afeganistão, o Brasil investe no
chamado "soft power", disseminando doações, ações
sociais, treinamento de pessoal e transferência de tecnologia para um número cada
vez maior de países pobres,
ou nem tanto, da América Latina, África e Ásia.
O objetivo é conquistar
simpatias que convertam em
influência política e votos,
não apenas para obter a sonhada vaga no Conselho Permanente de Segurança das
Nações Unidas, mas também
para vencer disputas em organismos e instituições internacionais.
O Brasil anda mesmo precisando de votos, depois das
derrotas para a OMC (Organização Mundial do Comércio),
para o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento)
e para a Unesco (o órgão da
ONU para educação). A última foi na eleição do diretor-executivo do Escritório da
ONU para o Combate ao Crime e Drogas.
O "soft power" está acelerado. Na sexta-feira passada,
enquanto o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva estava
no Paraguai, visitando linhas de transmissão de energia que o Brasil financia no
país, o Itamaraty divulgava
em Brasília a liberação de
US$ 500 mil para refugiados
colombianos no Equador.
O maior alvo do "soft power" é o Haiti, o país mais pobre das Américas e que acaba
de sofrer um terremoto devastador.
O Brasil detém o comando
militar das tropas de paz da
ONU no país, o governo destinou US$ 15 milhões logo
após a tragédia, e Lula enviou proposta ao Congresso
para um adicional de R$ 375
milhões.
Além disso, o Brasil atua
na reativação da produção
agrícola no país, fez contribuição voluntária de US$ 130
mil via Programa Mundial de
Alimentos, enviou mais US$
50 mil para a embaixada em
Porto Príncipe distribuir
água e comida e doou US$ 55
milhões para o Fundo de Reconstrução do Haiti.
Há duas coordenações
desse "saco de bondades",
ambas do Itamaraty. Uma é a
ABC (Agência Brasileira de
Cooperação), e a outra, a
CGFome (Coordenação Geral
de Ações Internacionais de
Combate à Fome).
O orçamento da ABC foi de
R$ 18,7 milhões em 2006 para R$ 52,6 milhões neste ano,
enquanto a equipe pulou de
90 para 160 funcionários de
2009 para 2010. São 56 países
assistidos, e o valor é considerado pequeno. Se computasse a hora técnica (remuneração dos profissionais) seria
cinco vezes maior, estima o
diretor da agência, ministro
Marco Farani.
A fila dos que recebem ajuda é encabeçada por Moçambique,Timor Leste, Guiné
Bissau, Cabo Verde, Paraguai, Guatemala, São Tomé e
Príncipe, Angola, Uruguai e
Cuba. E inclui Autoridade
Nacional Palestina, Níger,
Burundi, Uganda, Serra Leoa
e Nigéria, entre outros.
FILOSOFIA DA AJUDA
A filosofia da ajuda, como
diz, é fazer doações só em casos de emergência, privilegiando "sustentabilidade".
Exemplo: o projeto "Cotton
4", de US$ 4 milhões, para
desenvolver a indústria de algodão em Mali, Chade, Benin
e Burkina Fasso.
Já o CGFome tenta exportar experiências brasileiras
(como destinar alimentos da
agricultura familiar para escolas) inclusive para o Chile,
que não é pobre.
Mas são finalidades variadas e, só em junho deste ano,
foram R$ 6 milhões para ajuda, entre outras, às vítimas
dos episódios recentes de
violência no Quirguistão, a
reassentamentos no Sri Lanka e à recuperação do inverno rigoroso na Mongólia.
O coordenador do grupo,
ministro Milton Rondó Filho,
disse que o orçamento passou de R$ 2,4 milhões em
2007 para cerca de R$ 50 milhões neste ano, segundo ele,
para "reforçar a solidariedade e os gestos políticos brasileiros no mundo".
Segundo o embaixador Piragibe Tarragô, subsecretário do Itamaraty para África,
respalda a política Sul-Sul,
de aproximação com países
pobres e emergentes. "O Brasil quer ser reconhecido e ter
influência."
A investida já foi tema de
reportagem da revista britânica "The Economist", mas
com um alerta: "O país ainda
tem grandes bolsões de pobreza, e o envio de dinheiro
para o estrangeiro pode ser
controverso".
O presidente da Comissão
de Relações Exteriores do Senado, Eduardo Azeredo
(PSDB-MG), concorda: "É
uma ação tortuosa. Se você
fala em Haiti e países muito
pobres, é correto. Mas a busca pelo protagonismo fez
com que o Brasil exagerasse
nas suas relações e na sua
bondade", disse.
A oposição tenta impedir a
revisão do Tratado de Itaipu,
alegando que o aumento do
preço da energia excedente
que o Paraguai vende ao Brasil pode custar R$ 5,5 bilhões.
"Vamos resistir", diz.
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