São Paulo, sexta-feira, 01 de dezembro de 2006

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Chávez defende reeleição sem limite

Venezuelano confirma que proporá reforma da Constituição para que possa concorrer a mais de dois mandatos consecutivos

Presidente encerra campanha de "amor, êxtase e frenesi" e diz que sua prioridade, se reeleito, será o combate à corrupção

SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A CARACAS

Terno com gravata vermelha, a cor da "revolução", voz rouca dos últimos comícios permitidos pela lei, o presidente venezuelano Hugo Chávez entra no mesmo salão em que sua destituição foi assinada, no golpe de Estado abortado de 2002, para falar com a imprensa estrangeira, no Palácio Miraflores. É seu último encontro antes do pleito de domingo, que, segundo as pesquisas, devem conduzi-lo a mais seis anos no poder.
Serão 3h30 de uma entrevista em que ele cantará, citará muito seu colega brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e responderá a perguntas feitas por oito jornalistas sorteados. Falará que sua campanha foi de "amor, êxtase e frenesi". Reconhecerá que o combate à corrupção terá de ser uma das prioridades de seu próximo governo. E que a reforma constitucional, que começará já no dia 4 de dezembro, incluirá a cláusula da reeleição "indefinida", perpétua ou sem limite. A atual Constituição, de 1999, só permite uma eleição. A seguir, os principais tópicos.

 
CORRUPÇÃO NO GOVERNO - Defendo todos os meus ministros. Se tivesse a mínima suspeita de que um fosse corrupto, não estaria aí. Se alguém tem alguma denúncia concreta, isso tem de ser levado aos órgãos judiciais. Mas compreendo [a pergunta sobre se vai haver reforma ministerial por causa de denúncias de corrupção]. A partir de 4 de dezembro, isso é algo que eu terei de assumir com maior rigor: a luta contra a corrupção. As cinco grande linhas estratégicas dessa etapa [da revolução bolivariana] que se conclui foram política, social, econômica, territorial e internacional. Na que começa agora decidimos incorporar e colocar em primeiro lugar uma nova linha: a ética socialista.

REVOLUÇÃO OU REVOLUÇÃO - Aqui há duas opções, a nossa e a do império americano. Neste momento e por um período indeterminado, há essa revolução, e não há outro projeto possível na Venezuela. Que outros tentem instalar, bom, é uma democracia, mas uma coisa é tentar e outra é implementar.

REFORMA CONSTITUCIONAL - É uma das coisas que já anunciei. Não sou o ditador Hugo Chávez. Como esta é uma revolução muito dinâmica, é necessário fazer uma revisão, para ver onde é preciso reformá-la. Mas qualquer reforma tem de passar por um referendo nacional. Tenho idéias, mas designaremos uma comissão presidencial pró-Constituinte.

REELEIÇÃO PERPÉTUA - Comecei a falar da possibilidade da reforma para instalar na Constituição o direito de reeleição indefinida [perpétua], isso não deve estranhar o mundo. No Reino Unido, por exemplo, há. Por quantos anos governaram [os presidentes franceses François] Mitterrand, [Jacques] Chirac? Não estou planejando colocar na Constituição "o presidente Hugo Chávez ficará na Presidência até que morra". É algo muito diferente estudar a possibilidade. Faremos uma revisão integral da Constituição, à luz da nova realidade mundial e continental. Não vou colocar uma cláusula para ser rei.

CONSELHOS POPULARES - Vamos entrar na fase dos conselhos populares, que estão se estruturando. Uma das linhas estratégicas do período que começará não em 2 de fevereiro, mas já no dia 4 [de janeiro], é dar estrutura muito mais sólida, formal e legal ao poder popular. Trata-se da arquitetura do poder popular.

XINGAMENTO A BUSH NA ONU - Fui com meu discurso escrito. Levava o livro de Noam Chomsky [lingüista americano]. Quando li o discurso de Bush, disse que tinha de responder, porque ele falou como o dono do mundo. Ameaçou o mundo, e, como ninguém respondeu, eu disse: "Vai sobrar para mim outra vez". Veja o que aconteceu agora, o nocaute que ele levou nas eleições. Deveria renunciar. Se tivesse acontecido comigo, seria para renunciar. O povo está falando, que ele respeite. E aonde quer que vá esse cavalheiro, e eu tenha ocasião de dizer algo, direi com humildade, mas direi com firmeza. É incomensurável o dano que fez na América Latina o imperialismo norte-americano. Muito mais do que fizeram os 300 anos de império espanhol.

OTAN SUL-AMERICANA - Não somos o único país que compra armas no mundo nem na América Latina. Nem sequer o primeiro. O Brasil tem uma boa indústria militar, e isso é bom. Cada país, soberanamente, tem o direito de adquirir o armamento para sua defesa. Não temos plano de agressão. Mas hoje estamos ameaçados pelo império.
Vou contar uma história: esperamos quase três anos para comprar aviões do Brasil, os Tucanos e os Supertucanos. Até que o próprio Lula me disse: "Chávez, esquece o acordo". Inclusive, um dia me disse: "Vou falar com o Bush". Porque a Embraer é uma empresa privada que usa tecnologia americana. Veja a perversão do império: proíbe a Embraer de nos repor peças para o nosso Tucano.


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