São Paulo, terça-feira, 01 de dezembro de 2009

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ANÁLISE

Política americana se moveu; brasileira parou

DE WASHINGTON

O estranhamento entre a diplomacia americana e a brasileira no caso hondurenho se aprofundou nos dias seguintes ao Acordo Tegucigalpa-San José, ao longo de novembro.
Segundo pessoas envolvidas nas negociações, Brasília soube de antemão pelo então secretário-assistente e embaixador indicado para o Brasil, Thomas Shannon, de todos os termos do tratado e os teria aprovado sem restrições.
Entre eles estavam os dois artigos mais polêmicos, o de que caberia ao Congresso hondurenho a decisão sobre a volta ou não de Zelaya ao poder e o de que caberia aos próprios hondurenhos a adoção de um cronograma.
Na época, em entrevista da qual a Folha participou, Shannon chegou a dizer: "Não há um cronograma para o Congresso tomar sua decisão, e os negociadores foram claros sobre isso. Na verdade, na noite passada [1º de novembro], o principal negociador do sr. Zelaya disse que a comissão não poderia impor um cronograma ao Congresso, por ser [esta] instituição independente".
Na avaliação do Departamento de Estado, aquela era a saída possível naquele momento, levados em conta tanto o contexto político hondurenho como o americano. Em Tegucigalpa, um acordo de cláusulas mais draconianas morreria no nascimento.
Já em Washington, persistir na linha inicial, de que apenas com a volta incondicional de Zelaya ao poder é que o diálogo prosseguiria, estava travando não só a agenda de Obama para a região como outros temas importantes no Congresso. Nesse sentido, avaliou-se que o melhor era ceder em ambas as frentes e seguir adiante.
O Departamento de Estado julga que evoluiu de posição conforme os fatos "em solo" evoluíam, como disse um diplomata, enquanto o Itamaraty ficou parado -e não apresentou soluções factíveis.
A proposta de adiamento da eleição hondurenha, sugerida há duas semanas pelo governo brasileiro ao americano, não foi levada a sério, principalmente pela pouca antecedência com que surgiu.
Por isso, causou espanto quando diplomatas brasileiros começaram a dizer em público que não aceitariam os resultados da eleição, já que antes, em privado, haviam dito que aceitavam todos os termos do Acordo Tegucigalpa-San José.
O estranhamento foi agravado com o episódio da carta que Barack Obama escreveu a Luiz Inácio Lula da Silva, no domingo retrasado, o que coloca o brasileiro num pequeníssimo grupo de destinatários.
Ainda não foram bem digeridos pela Chancelaria americana o vazamento à imprensa e a entrevista dada pelo assessor de assuntos internacionais da Presidência antes mesmo que Lula tivesse respondido ao colega americano.
Agora, Washington observa com atenção a movimentação brasileira pós-eleição hondurenha. A disposição verdadeira de Obama de fazer do Brasil um parceiro estratégico será influenciada também por isso.
(SÉRGIO DÁVILA)


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