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Na Cisjordânia, ofensiva em Gaza não altera rotina
ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH
Nada poderia simbolizar melhor a divisão palestina do que o
frenético movimento no comércio e nos cafés de Ramallah
na tarde de ontem. Enquanto
Israel concluía o sexto dia da
maior ofensiva aérea já lançada
contra alvos palestinos, as estreitas ruas da capital política e
administrativa da Autoridade
Nacional Palestina (ANP) pareciam um formigueiro humano,
com famílias inteiras abarrotadas de compras e uma sensação
de rotina no ar.
As ruas limpas e o trânsito
bem organizado pela polícia
leal ao presidente da ANP,
Mahmoud Abbas, contrastam
com as cenas de destruição e
caos de Gaza, que estão nas TVs
de todos os cafés de Ramallah.
Não há indiferença, mesmo
porque muitos dos 25 mil moradores da cidade têm parentes
em Gaza. Mas a impressão é de
que o divórcio entre as duas
metades da Palestina já foi absorvido como parte da vida.
"É muito triste ver que o
mundo mais uma vez ignora a
brutalidade israelense contra
os palestinos", diz o arquiteto
Ahmed Soltani, enquanto
acompanha o noticiário da TV
Al Jazeera numa tabacaria no
centro da cidade. "Mas também
não da para entender o que o
Hamas esperava disparando
mísseis contra Israel."
Centenas de membros do Fatah, movimento liderado por
Abbas, buscaram refúgio em cidades da Cisjordânia como Ramallah, depois que foram expulsos pelo Hamas em junho de
2007, quando os dois grupos
travaram uma miniguerra civil
em Gaza. Foi o violento desfecho do curto governo de união
nacional que tentou em vão
conciliar a agenda nacionalista
do Fatah com o fundamentalismo islâmico do Hamas.
Com o apoio de Israel, dos
Estados Unidos e da União Européia, Abbas nomeou um novo
governo, para substituir o do
Hamas, eleito democraticamente em 2006. O resultado do
suporte político e financeiro é
visível nas ruas de Ramallah,
onde a economia floresce e a
ordem é mantida por policiais
bem equipados.
Mas a calma é aparente. Apesar da aliança entre Israel e a
ANP, na Cisjordânia há mais de
700 bloqueios militares, que
transformam a rotina dos palestinos numa sofrida e demorada corrida de obstáculos.
Além disso, a divisão entre as
facções se estende à população.
Muitos consideram uma tragédia para a luta palestina por um
Estado independente que a
derrota do Hamas possa significar uma vitória para o Fatah.
"Abbas esta numa situação
extremamente delicada. Sabe
que não pode herdar o poder do
inimigo", diz Hisham Al Daghma, assessor da representação
japonesa em Ramallah. "A destruição em Gaza vai aumentar o
ódio a Israel e a todos que forem associados a ele."
"O crescimento do Hamas só
aconteceu por falta de liderança e corrupção no Fatah", diz
Saed, estudante de jornalismo
que ontem visitou o túmulo de
Iasser Arafat, líder histórico do
Fatah. "Pelo visto, infelizmente
vamos ter que esperar outra geração de líderes para fundar o
nosso Estado".
(MARCELO NINIO)
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