São Paulo, sábado, 02 de abril de 2011

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OPINIÃO

Sem governo e sem dinheiro, a festa acabou no país que vive das aparências

JOÃO PEREIRA COUTINHO
COLUNISTA DA FOLHA, EM LISBOA

Portugal está sem dinheiro. E, pensando bem, sem governo. Mas, nas ruas e nos jornais, a preocupação é a mesma: o país tem um problema de "imagem".
Desconfio que, para a vaidade dos nativos, a "má imagem" é mais importante do que a má realidade, um raciocínio que se entende: nos últimos anos, o país viveu para as aparências.
Não apenas em obras faraônicas e ruinosas de diferentes governos, que se endividaram loucamente para oferecer ao mundo exposições universais e luxuosos estádios de futebol; mas também entre particulares, para os quais o acesso ao crédito barato, só possível pelo euro, não era apenas uma possibilidade de vida para ser usada com parcimônia. Era uma obrigação patriótica.
A festa acabou: com uma economia moribunda, uma dívida pública sem paralelo nos últimos 160 anos e a maior taxa de desemprego de sempre, os mercados financeiros deixaram de emprestar dinheiro ao país a juros razoáveis; neste momento, praticam extorsão pura e simples, em parte também por não acreditarem mais na capacidade do governo para corrigir as contas públicas.
Nenhum espanto: em 2010, ano em que os países periféricos da zona do euro entraram em grave crise, a obrigação era cortar nos gastos de forma decidida. Todos cortaram, exceto Portugal.
E agora?
Agora, o país vai para eleições a 5 de junho e, nos dois meses que faltam, duas hipóteses que sobram.
Primeira: o demissionário José Sócrates tudo fará para não pedir ajuda externa, nem que para isso Portugal tenha de vender a Torre de Belém.
Um pedido de ajuda seria a definitiva certidão de óbito para o governo, que ainda alimenta esperanças de regressar ao poder.
E aqui está a segunda hipótese: nas pesquisas desde a demissão, o mesmo José Sócrates perde para o Partido Social Democrata de Pedro Passos Coelho, mas não perde de forma humilhante. Pior: muitos apostam que o homem pode virar o jogo.
O meu barbeiro, aliás, vai ainda mais longe. E declara, em tom grave: "Se não fosse o Sócrates, aquela bruxa da Angela Merkel até nos obrigava a falar alemão".
Não são uma gracinha esses lusos?


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