São Paulo, quarta-feira, 02 de junho de 2010

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Israel sofre pressão interna e externa

Ataque contra frota é questionado por imprensa e membros do governo que foram excluídos de decisão

Egito abre passagem, e ativistas anunciam novo envio de ajuda, em atos que elevam clamor por fim de bloqueio


MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

Sob uma onda de condenação mundial pela ação naval que deixou nove ativistas mortos, o governo israelense também passou a ser alvo de uma bateria de ataques domésticos de grosso calibre.
Na imprensa as críticas se multiplicam contra a desastrada interceptação militar da frota de seis navios que tentava romper o bloqueio marítimo imposto por Israel e levar ajuda humanitária à faixa de Gaza.
Dois dias após o cerco à frota, algumas questões ainda intrigam os israelenses.
Entre elas, as principais são: por que Israel enviou um comando de elite, treinado para situações de guerra, para lidar com ativistas? Se havia indícios de sobra de que os tripulantes reagiriam com violência a qualquer abordagem, por que os soldados foram pegos de surpresa? Por que a ação se deu em águas internacionais?
"Uma pequena organização turca imbuída de fanatismo religioso e hostilidade ante Israel recrutou centenas de defensores de paz e justiça e conduziu Israel a uma armadilha", escreveu o aclamado autor David Grossman.

TV
As cenas de soldados descendo de helicópteros no navio Mari Marmara no meio de dezenas de manifestantes, que imediatamente começam a agredi-los com porretes, são exibidas repetidamente nas TVs israelenses. O Exército tenta usá-las como prova de que não havia alternativa senão abrir fogo para evitar linchamentos.
Mas muitos especialistas militares viram nas imagens só uma evidência do despreparo das tropas envolvidas.
"Era para ser uma operação muito simples, em que o Exército tem total controle da comunicação dos navios e capacidade de saber qual seria a reação dos ativistas", diz o general da reserva Daniel Rothschild.
O premiê Binyamin Netanyahu, que estava no Canadá quando ocorreu o incidente, cancelou o encontro que teria com o presidente dos EUA, Barack Obama, e antecipou sua volta a Israel. Numa reunião extraordinária do gabinete, ele disse que não cederá à pressão para aliviar o bloqueio a Gaza.
"É verdade que há pressão internacional e críticas a essa política, mas o mundo precisa entender que é crucial preservar a segurança de Israel e seu direito de defesa", disse.

EGITO
Ontem, porém, a pressão internacional pelo fim do bloqueio aumentou, com o anúncio do Egito de que decidira reabrir a passagem de Rafah, que liga Gaza ao país, para "aliviar o sofrimento do povo palestino".
A passagem, única saída terrestre do território que não passa por Israel, vinha sendo mantida fechada desde que o grupo extremista islâmico Hamas tomou o poder em Gaza, em 2007.
Ontem, o Movimento Gaza Livre, que organizou a frota interceptada na véspera por Israel, anunciou que está enviando outros navios com ajuda humanitária ao território palestino.
"Essa iniciativa não vai parar. Achamos que em algum momento Israel vai cair em si. Eles terão que pôr fim ao bloqueio em Gaza, e uma das maneiras de obrigá-los a isso é que continuemos a mandar os navios", disse Greta Berlin, líder da organização.
A pressão, contudo, não vem só de fora, mas do próprio gabinete. Ministros criticaram que a operação de abordagem da frota tenha sido aprovada numa reunião de apenas sete ministros, quando deveria ter passado pelo crivo do gabinete.
"Os inimigos de Israel propagam que os eventos sangrentos são parte inseparável da política de Israel. Não uma ação fracassada, mas assassinato a sangue-frio", escreveu o articulista Sever Plocker, do jornal "Yediot Aharonot". "Só existe um jeito de cortar as pernas dessa mentira: a demissão imediata de Ehud Barak [ministro da Defesa]."
A crise corrói ainda mais a imagem de Israel no mundo, que já vinha se deteriorando desde a ofensiva em Gaza, há um ano e meio. E afeta cidadãos comuns, não só o governo. Em 2008 mais de 500 mil turistas israelenses visitaram a Turquia, origem da maioria dos ativistas mortos. Ancara reagiu duramente ao ataque israelense, convocando inclusive o seu embaixador.
Ontem, o governo desaconselhou viagens e pediu aos cerca de 2.000 israelenses que estavam na Turquia que voltem o mais rapidamente possível para Israel.


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