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Defensor de autonomia estatal vê tentativa de autoritarismo
DO ENVIADO A SANTA CRUZ
Um dos líderes emergentes
da oposição boliviana, o senador cruzenho Oscar Ortiz, 36,
do Podemos, defende que o resultado do referendo de hoje
seja levado em conta a partir de
cada departamento e acusa o
governo Evo Morales de querer
usar a Constituinte para legalizar um regime autoritário.
A seguir, a entrevista concedida na quinta-feira à Folha na
sede do Podemos, principal
agremiação oposicionista, que,
após a eleição presidencial de
dezembro, se mudou de La Paz
para Santa Cruz.
(FM)
FOLHA - Por que o referendo deve
ser considerado pelos resultados de
cada um dos departamentos?
OSCAR ORTIZ - O referendo está
orientado como uma consulta
para estabelecer autonomias
departamentais. Isso é um processo longo, de três anos, quando a Assembléia Constituinte
ainda não estava convocada. No
ano passado, houve um acordo
para convocar a Assembléia e o
referendo para 2 de julho. Neste ano, chegamos a um acordo
sobre a pergunta. E ela fala claramente de vinculação departamental: basta que o "sim" ganhe num departamento para
que a Constituição tenha de
criar um regime de autonomia
para esse departamento. E o
"sim" ganhará em mais de um.
FOLHA - O governo de Evo Morales
tem uma interpretação diferente da
pergunta e deve ter pelo menos
uma maioria simples na Assembléia. Como fica o cenário político?
ORTIZ - A nossa grande preocupação é que não vemos um projeto autenticamente democrático adiante. É um projeto da linha de Chávez [presidente da Venezuela], que busca uma hegemonia para que a democracia
legalize uma ditadura. O presidente Chávez disse a eles: "Tenham 80% da Assembléia Legislativa", e o vice-presidente,
Alvaro García Linera, repete a
mesma coisa.
Com a Assembléia, eles querem constitucionalizar a sua visão, não a visão do conjunto boliviano, sobre como deve ser o
país. Eles querem dar uma embalagem democrática para um
regime autoritário.
FOLHA - De que forma o governo
agiu durante a campanha eleitoral?
ORTIZ - Temos um governo que
basicamente não respeita a lei,
que segue o modelo de Hugo
Chávez. Aqui, se estão somando várias coisas: por um lado, o
presidente Chávez vem para
um ato, no qual presenteia com
computadores, o que é contrário à nossa lei. Em segundo lugar, aparece a PDVSA [estatal
petrolífera venezuelana] fazendo propaganda, comprando os
direitos de transmissão da Copa do Mundo para a zona rural
e, no último mês, ela inunda de
propaganda todos os canais televisivos. E a PDVSA não tem
nenhuma operação na Bolívia.
Além disso, temos todos os ministérios fazendo propaganda,
usando a loa "Evo cumpre", falando da Constituinte. E a último que apareceu foi a campanha do MAS (Movimento ao
Socialismo) -a única que deveria ter ocorrido.
Agora, o canal 7, estatal, só
transmite os atos do presidente, dissimulados como atos de
governo, mas fala das eleições,
critica os opositores e ainda
transmite o programa [de Chávez] "Alô, Presidente" durante
cinco horas. Para a oposição,
não deram nenhum minuto.
Estamos em absoluta desigualdade de condições.
FOLHA - O governo de Santa Cruz
produziu material de campanha em
favor do "sim" no referendo, como
cartazes e adesivos. Também não é
uso de dinheiro público?
ORTIZ - É preciso confirmar
com o governo, mas tenho entendido que, em boa parte dessa campanha, o governo pediu o
apoio de atores privados.
FOLHA - Mas é a marca do governo
em propaganda política.
ORTIZ - Pela primeira vez em
180 anos nós elegemos um governador. É o primeiro passo
das autonomias. É natural que
eles queiram a vitória do "sim",
porque, sem isso, não têm razão de existir. Eles foram eleitos, mas não receberam mais
poderes e recursos. Para que isso ocorra, é necessário mudar a
Constituição e incluir um capítulo criando os governos departamentais.
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