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São Paulo, domingo, 02 de novembro de 2003

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AMÉRICA LATINA

Um dos últimos países a vetar a dissolução do casamento está prestes a aprová-la, em meio a intenso debate

Chile rompe tabu e deve aprovar divórcio

GUSTAVO CHACRA
DA REDAÇÃO

Com anos de diferença em relação aos vizinhos, o Chile, país em que 89% da população se declara católica, está para aprovar uma lei que regulariza o divórcio, em meio a um intenso debate interno sobre o tema. O país é um dos poucos, no mundo democrático, em que o divórcio é ilegal -Malta e Filipinas são os outros.
A lei já passou na Câmara e está no Senado, onde será votada nos próximos dias. É justamente entre os senadores que há maior oposição, devido ao elevado número de conservadores. Se aprovada -o que, segundo analistas, é praticamente certo-, a pauta voltará à Câmara e seguirá para a sanção do presidente Ricardo Lagos. A expectativa é que a lei entre em vigor no início de 2004.
Mas a tarefa não tem sido nada fácil para os defensores do divórcio no Chile. Vários obstáculos tiveram de ser superados -outros, porém, vão persistir, como a forte oposição da Igreja Católica.
O clero católico chileno comandou uma campanha aberta contra o divórcio e fez lobby com políticos para tentar barrar a lei. Depois, vendo que a derrota seria iminente, passou a atuar no sentido de restringir a lei ao máximo.
Entre as conquistas da igreja está a obrigatoriedade de um casal ter de esperar cerca de três anos, após a decisão de se separar, para conseguir o divórcio. Isso se houver comum acordo entre as partes. O prazo se eleva para cinco anos no caso de divórcio unilateral -se apenas um dos cônjuges estiver disposto a se divorciar.
A igreja queria também que os casais tivessem de declarar, no momento do casamento, se pretendiam ter um matrimônio com ou sem direito ao divórcio, mas a exigência foi rejeitada.
Uma campanha publicitária foi lançada na TV para mostrar os "malefícios do divórcio". Segundo a propaganda, os filhos de pais separados têm mais problemas, como consumo de cocaína e de álcool. Após críticas, a publicidade foi retirada.
Pesquisa publicada no diário "El Mercurio", de Santiago, indica que 70% dos chilenos são a favor da lei do divórcio. Outros 25% são contrários. Um número explica esse apoio popular: 3 em cada 10 casais do país são obrigados a recorrer a um "desquite à chilena" para se separar. Os cônjuges têm de levar testemunhas que digam que o casamento nunca se consumou e que, portanto, deve ser anulado. Essa via, porém, exige que haja comum acordo entre as partes e não prevê o destino dos bens do casal.
O atraso chileno na aprovação de uma lei de divórcio se deve, segundo a ministra do Serviço Nacional da Mulher, Cecília Pérez, a "razões culturais".
Uma das idealizadoras da nova lei, Pérez afirmou à Folha que "a formação religiosa, com forte traço católico, exerce influência nas instituições e na política chilenas". Desse modo, muitos temas no Chile tardam mais a serem discutidos. Segundo a ministra, o divórcio somente será aprovado -e, ainda assim, com uma série de restrições- porque os "cidadãos chilenos estão mais avançados dos que as instituições".
Pérez afirma que as pesquisas indicam que o apoio à união civil entre homossexuais é similar ao do divórcio, mas temas como o aborto ainda estão longe de entrar na pauta de discussões.



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