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Mais solto, Kerry se prepara para a decisão
JODI WILGOREN
DO "NEW YORK TIMES",
EM NEW HAMPSHIRE
Dentro de um elevador de hotel,
na madrugada do sábado, o senador John Kerry deu um tapa de
brincadeira na cabeça de seu leal
secretário de imprensa, David
Wade, que tudo vem agüentando
há muito tempo. "Nada mal para
quem está com queda de 30 pontos em New Hampshire, não
acha?", disse, segundo Wade.
Um ano atrás, como comentou
o ex-presidente Bill Clinton quando se posicionou ao lado de Kerry
na semana passada, em Filadélfia,
diante de cerca de 100 mil fãs, a
busca de Kerry pela indicação como candidato do Partido Democrata parecia fadada ao fracasso.
Agora Kerry está empatado com
o presidente pelo grande prêmio
da corrida. Na eleição primária
neste Estado, o fato de Kerry ter
demitido o coordenador de campanha e hipotecado sua casa para
lutar contra uma desvantagem
aparentemente insuperável parece não passar de uma lembrança
ruim.
Na subida final da montanha
russa que vem sendo a atual campanha eleitoral, Kerry vem se
mostrando tranqüilo e brincalhão, mas, ao mesmo tempo, centrado e prático, visivelmente cansado -e extremamente supersticioso. Ao mesmo tempo em que
as pessoas que o cercam traem cada vez mais o estresse crescente ao
qual andam submetidas, este
Kerry mais solto e mais jovial vem
tomando o lugar da persona superséria que o senador demonstrou durante boa parte do ano.
Atrás das cortinas de sua cabine
no avião, Kerry e alguns de seus
amigos mais íntimos terminaram
de assistir à trilogia de Indiana Jones em DVD. Outro dia, em Wisconsin, ele convocou o fotógrafo
da campanha para captar seu estrategista, o sério Bob Shrum,
usando uma cabeça de "queijo"
feita de espuma amarela.
Kerry vem entrando no chuveiro antes mesmo de receber seus
chamados para acordar, reduzindo seus bate-papos telefônicos
com seu círculo interminável de
assessores e, sobretudo, fazendo
seus enxutos discursos de comício em tom de determinação.
Na tarde da sexta-feira, após o
surgimento de uma fita gravada
por Osama bin Laden, ele soube
imediatamente que queria fazer
uma afirmação de unidade sobre
o assunto e atravessou sozinho
uma pista em West Palm Beach,
na Flórida, para fazê-lo.
Entretanto, à medida que suas
olheiras crescem, Kerry vem consumindo a energia de alguns públicos com seus modos não exatamente fascinantes, além de já ter
cometido várias gafes, como
quando torceu pelos Badgers, da
Universidade de Wisconsin, enquanto estava no Estado vizinho
do Iowa.
Carregando em um bolso um
trevo de quatro folhas que ganhou antes de sua volta por cima
espantosa nas reuniões políticas
de Iowa e, no outro, um castanheiro-da-Índia, símbolo do
Ohio, que alguém lhe deu quando
ele se tornou o porta-bandeira do
Partido Democrata, Kerry não
quer correr riscos. Basta olhar para o boné do Boston Red Sox que
enfeita os cabelos cacheados de
seu redator de entrevistas, o nova-iorquino Josh Gottheimer. Após
perder uma aposta durante o
Campeonato da Liga Americana,
Gottheimer, torcedor dos Yankees, foi obrigado a usar a boina
odiada durante o dia todo de 21 de
outubro. E agora seu patrão o
obriga a usá-la todos os dias.
Os assessores contam que Kerry
não assistiu à televisão nos momentos em que a CNN transmitiu
os resultados de pesquisas de intenção de voto, como as deste fim
de semana que mostraram o presidente Bush se adiantando nas
pesquisas, e se negou a falar de
uma potencial transição e até
mesmo de seus discursos de vitória ou de admissão da derrota, para a noite de hoje.
"É em parte superstição e em
outra parte uma simples questão
de disciplina", comentou um
membro de sua equipe.
John Kerry está com 60 anos e
está nessa batalha há quase dois
anos agora. Nestes dias finais da
campanha presidencial, o senador parece ter se investido de uma
confiança tranqüila, como se
acreditasse plenamente no que
diz a seus partidários: que "a eleição mais importante de nossa vida" está nas mãos deles.
Tradução de Clara Allain
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