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Análise
Abdullah cumpre seu papel no teatro eleitoral
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A desistência de Abdullah
Abdullah parece encaixar-se à
perfeição no teatro que o Ocidente montou para tentar justificar a eleição presidencial
afegã deste ano. A dúvida que
fica no momento diz respeito
ao que o líder dos tadjiques étnicos irá ganhar em troca do
bom comportamento de sair
sem incitar violência.
Como a administração Obama precisava do pleito para ter
algum dividendo político a oferecer para seu público interno,
já que colocou a guerra no Afeganistão como prioritária, eleições impraticáveis do ponto de
vista logístico ocorreram, com
atraso, em agosto.
A fraude evidente, que certamente iria ser repetida no segundo turno, levou os países
ocidentais a cortejarem Abdullah -ainda que fosse claro que
Hamid Karzai seria o vencedor
de qualquer modo. Mesmo numa hipotética vitória, Abdullah
teria contra si quase todas as
facções políticas do país. Achou
melhor pedir o chapéu.
Mas não o fez de graça. O modo cortês com que deixou a disputa indica que Abdullah fez algum tipo de acordo. Seria primário considerar que ele agora
se fortalece como uma alternativa de poder; acreditar em
acertos de bastidor é muito
mais condizente com a realidade política afegã. Não há espaço
para polos de poder no país ao
modo das democracias ocidentais, e sim para rivais acomodados ou não.
Paradoxalmente, no começo
deste ano Karzai era visto como
morto-vivo político. Mas tornou-se a única alternativa viável de poder palatável ao consórcio ocidental que administra de fato o Afeganistão. Sua
fraqueza converteu-se em seu
principal ativo, pois em vez de
tentar se consolidar monocraticamente, abriu espaço para
toda a sorte de senhores da
guerra e traficantes de drogas e
armas.
O leque de alianças garantiu
ao presidente a condição de
inevitabilidade. Indesejável, é
verdade, e é a partir daqui que o
próximo capítulo do drama afegão se desenrolará. Se ganhou
inesperado poder, Karzai está
mais ameaçado do que nunca.
Não faltam analistas próximos a Washington sugerindo
uma nova partilha de poder que
reconfigure a Constituição afegã, dando mais poderes para as
Províncias e deixando Cabul
como uma ilha fantasiosa onde
recepções de Estado e discursos pomposos dão o ar de uma
pretensa democracia.
Este plano tem ao menos
dois complicadores. Primeiro,
é preciso dar o quinhão de poder de forma proporcional às
importâncias relativas dos aliados de Karzai, mas sem melindrar o próprio. Abdullah também não pode ficar fora do jogo.
Segundo, e mais grave, é o Taleban. A violência irá continuar. Os líderes locais e os fundamentalistas sob o guarda-chuva da marca teriam de ser
incluídos de algum jeito na partilha para que haja algum tipo
de estabilidade no país. Mas fazer isso é ir contra o próprio cânone central da "guerra de
Obama".
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