São Paulo, domingo, 02 de dezembro de 2007

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Proposta de Carta induz à tirania, aponta estudo

Em vez de distribuir o poder popular, reforma submeteria conselhos a Chávez

Constitucionalista compara projeto a Constituições do socialismo real, que em tese previam democracia, mas estatizavam sociedade civil

DE CARACAS

Estudo comparativo realizado pelo professor de direito constitucional da UCV (Universidade Central da Venezuela) Enrique Sánchez argumenta que a proposta de reforma constitucional do presidente Hugo Chávez retira da Carta direitos do Estado democrático e introduz características de regimes da era soviética e até do nazifascismo.
"A organização do que denominam conselhos do Poder Popular é típica dos regimes de socialismo real dos tempos soviéticos, dos conselhos de trabalhadores, populares, que fracassaram em distribuir esse poder popular", afirmou Sánchez à Folha. "A única maneira de reduzi-los à unidade era submetê-los a um líder ou a um partido único, perdendo seu caráter de representação."
Em seu estudo, Sánchez diz que a organização dos Conselhos Comunitários como um Poder público "equivale à estatização da sociedade civil. As organizações não-governamentais sucumbirão todas diante da figura dos Conselhos de Poder Popular, que serão outros órgãos mais do Estado".

Fascismo
O jurista da UCV, que tem o curso de direito mais tradicional da Venezuela, afirma que, ao concentrar mais poderes no presidente e permitir que Chávez se reeleja indefinidamente, a reforma parte do pressuposto da "confiança ilimitada no líder", típica do nazifascismo.
"A forma com que o presidente está sendo definido é evidentemente tomada dos regimes nazifascistas, em que o representante da vontade geral era praticamente ele apenas", disse. Como exemplo, cita a nova atribuição do Executivo de administrar a política monetária: "Chávez se converte no funcionário em que estarão reunidas as funções de gastar e de fabricar a moeda com a qual ele financia os gastos. Isso só foi visto nos regimes tirânicos, nos quais o líder se impunha sobre todas as instituições de uma maneira absoluta".
"Se a isso se agrega a maneira de apresentá-lo ao povo, que não é nada além de um séquito de fiéis ao líder por uma razão de confiança, isso é tipicamente fascista", concluiu Sánchez.
Essa interpretação é fortemente rechaçada pelo deputado oficialista Calixto Ortega. Segundo ele, a essência da reforma constitucional "é reforçar o poder do povo".
"O presidente não vai administrar sozinho a polícia monetária. Fará isso junto com o BC da Venezuela", disse à Folha.
Sobre a perda de direitos assegurados na Carta atual, o professor da UCV menciona, entre outros, o fim das eleições para o governo do Distrito Federal, que passa a ser indicado por Chávez, o mesmo ocorrendo em novas unidades territoriais que ele poderá criar.
Mas a perda mais grave, diz Sánchez, é a supressão dos direitos ao devido processo e à informação caso o presidente decrete estado de exceção, hoje assegurado no artigo 337.
Ao justificar a modificação, o governo afirma que a medida é necessária ao criar instrumento para que o Estado possa combater um eventual golpe como o ocorrido em abril de 2002, que teve a participação ativa de canais de TV privados.
Outro estudo, feito pelo decano da Faculdade de Ciências Jurídicas e Políticas da UCV, Jorge Pabón, aponta que a reforma está dando caráter legal ao que o governo Chávez já faz. "Se a Constituição de 1999 não tem sido limite para ele fazer o que quer, o que não fará quando se aprove essa."


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