São Paulo, domingo, 03 de abril de 2011

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"Clarín" é obstáculo a Cristina, diz diretor

Para Ricardo Kirschbaum, governo argentino "passou dos limites" na tentativa de ter controle sobre a imprensa

No domingo passado, sindicalistas barraram a circulação do diário; jornalista diz não haver diálogo com Presidência

LUCAS FERRAZ
DE BUENOS AIRES

Diretor de Redação do "Clarín" desde 2003, o jornalista Ricardo Kirschbaum, 62, afirma que a briga do governo Kirchner com a imprensa é motivada pelo "controle do poder". "O jornal é um obstáculo para o kirchnerismo."
Kirschbaum assumiu a direção do maior jornal da Argentina (300 mil exemplares diários) no mesmo ano em que Néstor Kirchner assumiu a Presidência argentina.
Sobre as boas relações com o governo até 2007, ele diz que foi uma "atitude responsável" após a crise de 2001 e nega que os negócios tenham influído na ruptura.
No domingo passado, sindicalistas pró-Casa Rosada bloquearam o parque gráfico do "Clarín", impedindo sua circulação e a do jornal esportivo "Olé". "Passou dos limites. Se há alguma sensatez, isso deveria acabar."
No "Clarín" há 35 anos, Kirschbaum já foi correspondente em Buenos Aires dos brasileiros "Jornal do Brasil" e "Jornal de Brasília". Leia trechos da sua entrevista.

 

Folha - Por que a situação chegou ao ponto de um jornal não poder circular?
Ricardo Kirschbaum
- A primeira explicação é porque estamos na Argentina. O governo tem uma estratégia política de criar contradições entre seus vários setores.

Ele precisa de um inimigo?
Exatamente. Querem um jornalismo dependente do poder, consideram que a comunicação tem de estar nas mãos do governo. E querem vencer o que chamam poderes de fato, como a imprensa.

E o que esperar de um ano eleitoral em que a presidente Cristina Kirchner é favorita?
Ainda falta muito, mas a oposição não se organizou. O governo faz o que faz porque a oposição é muito débil.

Refere-se ao enfrentamento aberto com a imprensa?
O que aconteceu ao "Clarín" poderia ocorrer a qualquer um. Passou dos limites.

Durante o mandato de Néstor Kirchner (2003-07), o governo e o "Clarín" foram próximos. O que explica a mudança?
A crise argentina, de 2001 a 2003, pedia atitudes responsáveis. Depois aconteceu o conflito com o campo, em 2008, e o governo não admitiu que um meio de comunicação estivesse contra eles.
A partir daí, abriu-se uma brecha entre o governo e a mídia, sobretudo o "Clarín". Eles começaram uma série de ações, que não cessaram, para nos afetar. O que governo quer é controlar a imprensa.

Os negócios do Grupo Clarín, como os serviços de TV a cabo, não originaram a briga?
Não é verdade.

Por quê?
Não tenho como dizer o porquê, mas não é verdade. O que está em jogo, para o kirchnerismo, é o poder. E o "Clarín" é um obstáculo a que eles controlem o poder.

O diário vai tomar alguma medida contra bloqueios?
Já recorremos ao que podíamos. O jornal tinha uma sentença favorável na Justiça, não respeitada. Esse episódio pode não se repetir, mas é provável que se repita.

Não é possível o diálogo?
Ao governo não interessa falar. Sou o diretor do jornal mais importante da Argentina e o secretário de Comunicação não me atende. Nossos jornalistas são impedidos de trabalhar, somos excluídos das coletivas. A Argentina sempre tem coisas surreais.


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