São Paulo, domingo, 03 de abril de 2011

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Negócios estão na origem da crise dos Kirchner com diário

Amistosa durante o governo de Néstor, relação mudou quando jornal apoiou produtores rurais contra Cristina

Até 2007, Casa Rosada havia apoiado expansão do grupo na TV a cabo; para jornalista, disputa não tem "bonzinhos"

DE BUENOS AIRES

Antes de se tornarem inimigos, o governo Kirchner e o Grupo Clarín tiveram uma amistosa e lucrativa relação, a ponto de a Casa Rosada apoiar a expansão dos negócios do conglomerado no mercado de TV paga.
Hoje, o que o governo considera uma briga ideológica virou motivo de preocupação pela falta de liberdade de imprensa na Argentina.
No final do seu mandato, em dezembro de 2007, o próprio ex-presidente Néstor Kirchner, morto em outubro de 2010, assinou a fusão das empresas Multicanal e Cablevisión. A operação deu ao Grupo Clarín a liderança no mercado de TV a cabo.
Em 2008, já com Cristina na Presidência, houve uma crise entre o governo e produtores rurais por causa da alta de impostos.
Nessa época o Grupo Clarín, antes simpático à Casa Rosada, mudou sua posição editorial e criticou o governo. A guerra estava detonada.
O kirchnerismo se sentiu traído pelo conglomerado e começou a elaborar lei contra o monopólio da mídia.
O Grupo Clarín seria o principal afetado pela legislação, que visava regular o setor de rádio e TV, limitando a participação de empresas privadas nesses mercados. Aprovada em 2009, a lei ainda não entrou em vigor porque é contestada na Justiça.
"Kirchner percebeu que o Clarín não seria seu sócio e começou a brigar contra o grupo", diz Luis Majul, autor do livro "O Dono", em que narra os negócios "públicos e privados" do ex-presidente.
Antes da crise no campo, destaca Majul, houve uma pequena tensão: o governo freou a tentativa do grupo de entrar no mercado das telecomunicações com pacotes "triple play" (internet, telefone e TV a cabo).

SEM BONZINHOS
"O governo prometera aprovar a operação, mas depois recuou porque o Clarín ficaria com um poder muito grande", afirma o jornalista, que trabalha num novo livro sobre a relação entre Néstor Kirchner e Héctor Magnetto, um dos acionistas do grupo.
O "Clarín" nega que os negócios tenham influenciado a mudança editorial em relação ao casal Kirchner.
"Não há bonzinhos nessa briga", diz o jornalista Jorge Lanata, um dos nomes mais odiados pela Casa Rosada. "O Clarín não é oficialista, é "clarinista". O grupo sempre dependeu do governo para os seus negócios", afirma.
Um dos fundadores do "Página 12", jornal que hoje é partidário do kirchnerismo, Lanata está fora do jornalismo diário, trabalhando atualmente na produção de um documentário.
"É impossível fazer jornalismo na Argentina. Se hoje é o "Clarín" que não pode circular, amanhã posso ser eu."
Na tentativa de sufocar o Clarín, o governo levou à Justiça questionamentos sobre as empresas e as relações familiares de Ernestina Noble, dona do conglomerado.
Além de pedir o cancelamento da fusão entre Multicanal e Cablevisión, a Casa Rosada afirma que os herdeiros de Noble (adotados por ela em 1976) são filhos biológicos de militantes de esquerda mortos na ditadura.
(LUCAS FERRAZ)


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