São Paulo, sexta-feira, 03 de maio de 2002

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ORIENTE MÉDIO

Líder palestino critica o país, mas se diz pronto a negociar a paz com Sharon; EUA esperam que ele tome "novo rumo"

Após 34 dias, Arafat deixa QG e ataca Israel

France Presse
Arafat reza pelas vítimas da ação do Exército de Israel em Ramallah


DA REDAÇÃO

O presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Iasser Arafat, 72, deixou ontem seu quartel-general em Ramallah, na Cisjordânia, onde estava confinado pelo Exército de Israel havia 34 dias -desde 29 de março.
Ele deixou o edifício, destruído em grande parte pela ofensiva militar, entrou num carro Mercedes preto e partiu fazendo com os dedos o símbolo do "V" de vitória para centenas de simpatizantes.
Dirigiu-se então para um passeio pela cidade. Dois carros com seguranças armados pendurados para fora das janelas acompanhavam sua limusine, que seguiu para um hospital. Antes de entrar, Arafat parou e rezou no estacionamento, local onde foi improvisado um cemitério para palestinos mortos na ação israelense.
Indagado sobre como se sentia ao ver um edifício ministerial danificado, Arafat declarou, apontando para crianças: "Uma dessas crianças vai abanar a bandeira em um Estado palestino".
O cerco militar ao líder palestino foi suspenso na madrugada de ontem, após acordo que resultou na transferência de seis palestinos procurados por Israel que se abrigavam no quartel-general de Arafat a uma prisão em Jericó, onde estarão sob observação de americanos e britânicos.
Israel anunciou ter se retirado completamente de Ramallah, mas suas forças devem continuar cercando a cidade.
Apesar da euforia com a libertação de Arafat e o fim de um dos episódios mais graves dos 19 meses de Intifada, há poucas razões para otimismo. Israel segue fazendo incursões diárias na faixa de Gaza e na Cisjordânia. O grupo extremista islâmico Hamas promete voltar a promover atentados suicidas com toda a força.
Os EUA, que ofereceram a solução para o impasse em Ramallah e tentam obter um cessar fogo israelo-palestino, exigem que Arafat modere a retórica e tome medidas efetivas para impedir ataques terroristas contra Israel.
"Um Estado palestino precisa ser obtido por meio de negociação e do fim da ocupação", afirmou ontem o presidente americano, George W. Bush. "E esse Estado não pode estar baseado sobre uma fundação de terror e corrupção." Seu secretário de Estado, Colin Powell, acrescentou: "Tenho certeza que Arafat agora vai tomar um novo rumo".
Com a maior parte de seus serviços de segurança destruídos ao longo da operação "Muro Protetor" -ofensiva de Israel para, segundo o país, eliminar a "infra-estrutura do terror" na Cisjordânia, lançada após atentado suicida na Páscoa judaica- Arafat enfrenta dificuldades práticas e políticas para agir contra os extremistas.

Discurso ambíguo
As primeiras declarações de Arafat após o fim do cerco trouxeram as mesmas características do passado. Para consumo doméstico, apresentou-se como um líder enfurecido com a campanha orquestrada pelo premiê israelense, Ariel Sharon. Para a comunidade internacional, reservou linguagem mais conciliadora.
Ele criticou as "atividades bárbaras" do Exército israelense e disse que os "fanáticos que assassinaram o premiê Yitzhak Rabin estão agora no poder". Disse que a batalha travada no campo de refugiados de Jenin passará a ser conhecida como "Jeningrado" -uma referência ao cerco nazista à cidade soviética de Stalingrado, durante a Segunda Guerra.
Por outro lado, declarou não ter esquecido da "paz dos bravos que assinei com meu parceiro Rabin". Arafat e Rabin assinaram em 1993 os acordos de Oslo, que abriram caminho para um processo de paz baseado na gradual retirada de Israel dos territórios ocupados em troca de reconhecimento palestino do Estado judeu.
Ele afirmou que ainda vê Sharon, arqui-rival há décadas, como um parceiro para a paz. "Ele é a pessoa que foi eleita pelos israelenses, e estamos lidando com ele, porque nosso parceiro é o povo israelense", disse.
Washington deve tentar levar as duas partes de volta ao diálogo. Bush receberá Sharon na Casa Branca na próxima semana. "Estou otimista. Estamos fazendo bom progresso", disse o presidente dos EUA. "Afinal, há uma semana, Iasser Arafat estava fechado em Ramallah (...) Agora ele está livre para mostrar liderança."
Com sua popularidade reforçada entre os palestinos, Arafat ainda é visto com desconfiança nos EUA. Bush se nega a recebê-lo e disse que ele tem agora uma chance para "mostrar que pode liderar" e "denunciar o terrorismo".
Já Sharon, que acusa Arafat de estar ligado a ações terroristas, declarou ontem que não pode dar garantias de que o líder palestino será autorizado a voltar aos territórios sob sua autoridade se viajar ao exterior. "Não vamos dar garantias porque, no passado, quando ele saía, isso era sinal de uma onda de terror."
O ministro palestino da Informação, Iasser Abed Rabbo, disse que Arafat possui "garantia internacional" de que pode viajar e voltar sem ser importunado.

Com agências internacionais

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